CICLO DE PILATOS – APOCRIFO

 

CICLO DE PILATOS

 

Há, na literatura apócrifa, um ciclo chamado de Pilatos, com vários textos que falam da descida de Cristo ao Inferno, da Ressurreição e dos fatos ocorridos na vida de Pilatos, Herodes e Tibério depois da Crucificação. Todos foram escritos durante os séculos I e II, mas podem ter sofrido acréscimo e mutilações.

 

RETRATO DE JESUS

CARTA DE LENTULUS PUBLIUS AO IMPERADOR TIBÉRIO CÉSAR.

 

Eis aqui, enfim, a resposta que com tanta ansiedade esperáveis. Ultimamente apareceu na Judéia um homem de estranho poder, cujo verdadeiro nome é Jesus Cristo, mas a quem o povo chama “O Grande Profeta” e, seus discípulos, “O Filho de Deus”. Diariamente contam-se dele grandes prodígios: ressuscita os mortos, cura todas as enfermidades e traz assombrada toda Jerusalém com a sua extraordinária doutrina.

É um homem alto e de majestosa aparência; sua face, ao mesmo tempo severa e doce, inspira respeito e amor a quem a vê. Seu cabelo é da cor do vinho e desce ondulado sobre os ombros; é dividido ao meio, ao estilo nazareno. Sua fronte, pura e altiva, sua cútis pálida e límpida; a boca e o nariz são perfeitos; a barba é abundante e da mesma cor dos cabelos; as mãos, finas e compridas; os braços, de uma graça encantadora; os olhos azuis, plácidos e brilhantes.

É grave, comedido e sóbrio em seus discursos. Repreendendo e condenando, é terrível; instruindo e exortando, sua palavra é doce e acariciadora. Ninguém o viu rir, mas muitos o têm visto chorar. Caminha com os pés descalços e a cabeça descoberta. Vendo-o à distância, há quem o despreze, mas em sua presença não há quem não estremeça com profundo respeito.

Quantos se acercam dele, dizem haver recebido enormes benefícios, mas há quem o acuse de ser um perigo para Vossa Majestade, porque afirma publicamente que os reis e os escravos são todos iguais perante Deus.

 

RETRATO DO SALVADOR

 

Tinha Jesus um rosto belíssimo e vivo; o cabelo era alourado, não muito volumoso e ligeiramente ondulado; sobrancelhas negras e ligeiramente arqueadas. Seus olhos, da cor de azeitona, brilhavam com uma expressão admirável. Seu nariz era reto, barba loura, não muito comprida, os cabelos eram bem longos, pois nenhuma navalha num mão de homem algum jamais tocaram-lhe a cabeça, à exceção de sua Mãe, na infância. Mantinha o pescoço algo inclinado, de sorte que não apresentava ar de arrogância. De tez clara, seu rosto não era redondo nem comprido, mas mais comprido que largo e ligeiramente corado, como as faces de sua Mãe. A seriedade, a prudência e a serenidade irmanavam-se e resplandeciam em seu semblante. Em uma palavra, era de todo parecido com sua Mãe.

 

CARTA DE PÔNCIO PILATOS AO IMPERADOR ROMANO

Pôncio Pilatos saúda o Imperador Tibério César.

Jesus Cristo, que te apresentei explicitamente nos meus últimos relatórios foi, finalmente, entregue a um duro suplício a pedido do povo, cujas instigações segui por medo

 

 

 

e contra minha vontade. Um homem piedoso e austero como esse, não existiu nem existirá jamais em época alguma. Mas a verdade é que houve um estranho empenho do povo para conseguir a crucificação deste embaixador da Verdade, além de uma conspiração de todos os escribas, chefes e anciãos, malgrado os avisos dos seus profetas, ou, como nós dizemos, as sibilas. E enquanto estava dependurado na cruz apareceram sinais que sobrepujavam as forças naturais e que pressagiavam, segundo o entendimento dos filósofos, a destruição de todo o mundo. Seus discípulos ainda vivem e não desdizem o Mestre nem suas obras e nem a pureza de sua vida; e continuam ainda fazendo muito bem em seu nome. Portanto, se não fosse pelo temor de uma possível revolta entre o povo que já estava quase enfurecido, talvez aquele insigne varão ainda pudesse estar entre os vivos. Atribui, pois, mais ao meu senso de fidelidade para contigo do que ao meu próprio capricho, o fato de não haver resistido com todas as minhas forças para que o sangue de um justo, isento de toda culpa, mas vítima da malícia humana, fosse perversamente vendido e sofresse toda a paixão. Aliás, como dizem os intérpretes de suas escritas, poupá-lo redundaria em sua própria ruína. Adeus. O quinto dia das calendas de abril.

CARTA DE TIBÉRIO A PILATOS

 

O que se segue é a resposta de César Augusto a Pôncio Pilatos, governador da província oriental. O próprio César acrescentou uma sentença de seu próprio punho e letra e enviou-a pelo mensageiro Raab, ao qual confiou, ainda, dois mil soldados:

“Uma vez que tiveste a ousadia de condenar Jesus Nazareno à morte, de uma maneira violenta e totalmente perversa e, antes mesmo de proclamar a sentença condenatória, puseste-O nas mãos dos insaciáveis e furiosos judeus; uma vez que, além disso, não tiveste compaixão deste justo, mas depois de ensangüentar o açoite e de submetê-lo a uma horrível sentença e ao tormento da flagelação, entregaste-o, sem nenhuma culpa de sua parte, ao suplício da crucificação, não sem antes haver aceitado presentes pela sua morte; uma vez que, enfim, manifestaste compaixão com os lábios, mas O entregaste de coração a alguns judeus sem lei; por tudo isto, serás tu próprio conduzido à minha presença, carregado de correntes, para que apresentes tuas desculpas e prestes contas da vida que entregaste à morte sem nenhum motivo. Mas, ai da tua dureza e da tua falta de vergonha! Desde que este fato chegou aos meus ouvidos, estou sofrendo na alma e sinto que minhas entranhas se espedaçam, pois veio a mim uma mulher, que se diz discípula d’Ele (Maria Madalena, de quem segundo afirma, expulsou sete demônios) e testemunhou que Jesus operou portentosas curas, fazendo com que cegos vissem, coxos pudessem andar, surdos pudessem ouvir, leprosos fossem limpos, e que todas estas curas aconteceram apenas com a sua palavra. Como concordaste que fosse crucificado sem nenhum motivo? Porque, se não querias aceitá-lo como Deus, deverias, pelo menos, ter-te compadecido d’Ele como médico que era. Até o próprio relatório que me chegou de tua parte está reclamando o teu castigo, já que nele afirmas que Aquele era superior a todos os deuses venerados por nós. Que se passou para que o entregasses à morte? Saibas, pois, que, assim como tu O condenaste injustamente e O mandaste matar, da mesma maneira eu, com todo o direito, farei justiça contigo; e não somente contigo, mas também com todos os teus conselheiros e cúmplices dos quais recebeste o suborno da morte.”

Então Tibério César entregou a carta aos emissários e, juntamente com ela, a sentença na qual ordenava por escrito que todo o povo dos judeus passasse pelo fio da espada e que Pilatos fosse trazido como réu até Roma, juntamente com os principais dentre os judeus,

 

 

 

aqueles que à época eram governadores: Arquelao, filho do odiadíssimo Herodes, e seu cúmplice Filipo; o pontífice Caifás e Anás, seu sogro, e todos os demais judeus responsáveis.

Assim, pois, Rachaab marchou com os soldados e fez como lhe haviam ordenado, passando pela espada todos os varões dentre os judeus, enquanto que as suas impuras mulheres ficavam expostas à violação dos pagãos, o que fez brotar uma ralé abominável, como, aliás, fora engendrado por Satã. Depois o emissário cuidou de Pilatos, de Arquelao e Filipo, de Anás e Caifás e de todos os responsáveis dentre os judeus, e, carregando-os de correntes, pôs-se com eles a caminho de Roma. Aconteceu que, ao passar por certa ilha chamada Creta, Caifás perdeu a vida de uma maneira violenta e miserável. Então, carregaram-no para sepultá-lo, mas nem sequer a terra dignou-se admiti-lo em seu seio, já que o arremessava para fora. Quando os que ali estavam presenciaram esse fato, apanharam pedras e arremessaram-nas sobre o cadáver, que foi desta forma enterrado. Os demais chegaram até Roma.

Existia entre os reis da antigüidade o costume de livrar da condenação um réu de morte que contemplasse o rosto real. César, então, deu as ordens necessárias para não se deixar ver por Pilatos. Assim, pois, meteram-no numa caverna e ali o deixaram, conforme as ordens do imperador.

Da mesma forma ordenou que Anás fosse envolto numa pele de boi, de modo que quando o couro secasse ao sol ele fosse constringido e suas entranhas saíssem pela boca. Assim, violentamente, perdeu ele sua miserável vida. Aos demais presos judeus executou- os mandando passá-los pelo fio da espada. Mas a Arquelao, o filho do odiadíssimo Herodes, e a seu cúmplice Filipo, condenou-os ao suplício da empalação.

Certo dia o imperador saiu de casa para uma caçada e ia em perseguição a uma gazela, quando esta parou precisamente em frente à boca da caverna onde estava Pilatos. Já próximo da execução, Pilatos tentou fixar seus olhos em César, mas não o conseguiu porque a gazela postou-se na frente dele. César então disparou uma flecha,   visando o animal, mas o projétil atravessou a entrada da caverna e matou Pilatos. Todos aqueles que crêem ser Cristo o verdadeiro Deus e nosso Salvador, glorificai-O e engrandecei-O, pois a Ele pertencem a bem-aventurança, a honra e a adoração junto ao seu Pai no princípio e seu Espírito consubstancial, agora e sempre e por todos os séculos dos séculos. Amém.

 

RELATÓRIO DE PILATOS ENVIADO A CÉSAR AUGUSTO

Naqueles dias que se seguiram à crucificação de Nosso Senhor Jesus Cristo, ao tempo de Pôncio Pilatos, governador da Palestina e da Fenícia, estas memórias foram compostas em Jerusalém e referem-se ao que os judeus fizeram contra o Senhor. Pilatos, então juntamente com a sua correspondência particular, enviou este relatório a César:

“Ao excelentíssimo, piedosíssimo, diviníssimo e mui terrível César Augusto, o governador da província oriental, Pilatos.

“Excelência: O relatório que lhe farei procede do fato de sentir-me coibido pelo temor e pelo tremor. Pois já sabeis que nesta província que governa, única entre as cidade quanto ao nome de Jerusalém, o povo judeu em massa entregou-me um homem chamado Jesus, acusando-o de muitos crimes que não puderam demonstrar com suficientes razões. Havia entre eles uma facção sua inimiga porque Jesus dizia-lhes que o Sabat não era dia de descanso nem de festa para ser guardado. Ele, efetivamente, operou muitas curas nesse dia: devolveu a visão a cegos e a faculdade de andar a coxos; ressuscitou os mortos; limpou os

 

 

 

leprosos; curou os paralíticos, incapazes de ter impulsos corporais ou ereção de nervos, mas somente voz e articulações, dando-lhes forças para andar e correr. E extirpava qualquer enfermidade somente com o uso de sua palavra. Outra nova ação mais assombrosa, desconhecida entre nossos deuses: ressuscitou um morto de quatro dias somente dirigindo- lhe a palavra; e é de se notar que o morto já tinha o sangue coagulado e estava putrefato por causa dos vermes que saíam de seu corpo e exalava um mal cheiro de cão. Vendo-o, então, imóvel como estava no sepulcro, ordenou que se levantasse e corresse; e ele, como se não tivesse um mínimo de cadáver, mas fosse como um esposo que sai do quarto nupcial, assim saiu do sepulcro, transbordante de perfume.

“E a alguns estrangeiros, totalmente endemoniados, que moravam nos desertos e comiam suas próprias carnes, conduzindo-se como bestas e répteis, também a eles tornou- os honrados cidadãos, fê-los prudentes com a sua palavra e preparou-os para serem sábios, poderosos e gloriosos e para confraternizarem com todos os que odiavam os espíritos imundos e perniciosos que habitavam neles anteriormente, os quais arremessou nas profundezas do mar.

“Alem disso, havia outro que tinha a mão seca. Melhor dizendo, não somente a mão, mas toda a metade do seu corpo estava petrificada, de maneira que não tinha nem a figura de um homem nem a dilatação de músculos. Também este foi curado com somente uma palavra e ficou sadio.

“Havia uma outra mulher com problemas hemorrágicos, cujas articulações e veias estavam esgotadas pelo fluxo de sangue, a tal ponto que já nem sequer se podia dizer que tinha um corpo humano. Mais se assemelhava a um cadáver. Havia ficado até sem voz. Tal era a gravidade de seu estado que nenhum médico do território encontrou uma forma de curá-la ou sequer de lhe dar uma esperança de vida. Certa vez Jesus passava por ali em segredo e a mulher, retirando forças da sombra dele, tocou, por detrás, a fímbria de sua túnica. Imediatamente sentiu uma força que preenchia seus vazios e, como se nunca tivesse estado doente, começou a correr agilmente em direção à sua cidade, Cafarnaum, caminhando de tal forma que quase igualava qualquer pessoa que percorresse de uma só vez seis jornadas.

“Isto, que acabo de relatar com toda a ponderação, Jesus fez num Sabat. Além disso, operou outros milagres maiores do que estes, de maneira que chego a pensar que suas façanhas são superiores àquelas que fazem os deuses venerados por nós.

“Este, pois, é Aquele a quem Herodes, e Arquelao, e Filipo, Anás e Caifás, entregaram- me em conivência com todo o povo, pressionando-me para que eu o julgasse. E assim, embora sem haver constatado de sua parte nenhum tipo de delito ou má ação, mandei que O crucificassem depois de submetê-lo à flagelação.

“E enquanto O crucificavam sobrevieram algumas trevas que cobriam toda a terra, deixando o sol obscurecido em pleno meio-dia e fazendo aparecer as estrelas, as quais não resplandeciam; a luz parou de brilhar, como se tudo estivesse tingido de sangue, e o mundo dos infernos foi absorvido; e, com a queda dos infernos, até mesmo o que era chamado de santuário desapareceu da vista dos próprios judeus. Finalmente, pelo eco repetido dos trovões, produziu-se uma fenda na terra.

“E quando ainda o pânico se fazia sentir apareceram alguns mortos que havia ressuscitado, como testemunharam os próprios judeus, e disseram ser Abraão, Isaac, Jacó, os doze patriarcas, Moisés e Job, e, como eles diziam, os primeiros dos que haviam falecido três mil e quinhentos anos antes. E muitíssimos deles, que eu também pude ver que

 

 

 

apareceram fisicamente, lamentavam-se por sua vez, por causa dos judeus, pela prevaricação que estavam cometendo, pela sua perdição e pela perdição de sua lei.

“O medo do terremoto durou desde a sexta até a nona hora da sexta-feira. E, ao chegar a tarde do primeiro dia da semana, ouviu-se um eco vindo do céu, que por sua vez adquiria um resplendor sete vezes mais vivo que todos os dias. Na terceira hora da noite chegou a aparecer o sol, brilhando mais que nunca e embelezando todo o firmamento. E da mesma forma que no inverno os relâmpagos sobrevêm de repente, assim também apareceram subitamente alguns varões, excelsos pelas suas vestes e pela sua glória, que tinham vozes semelhantes ao soar de um enorme trovão, dizendo: “Jesus, o que foi crucificado acaba de ressuscitar. Levantai do abismo aqueles que estão presos nas profundezas do inferno”. E a fenda da terra era tamanha que parecia não ter fundo, já que deixava ver os próprios fundamentos da terra, entre os gritos daqueles que estavam no céu e passeavam fisicamente no meio dos mortos que acabavam de ressuscitar. E Aquele que deu vida aos mortos e acorrentou o inferno dizia: “Dai este aviso aos meus discípulos: Ele segue à vossa frente até a Galiléia; ali poderão vê-lo’.”

“Durante toda aquela noite a luz não deixou de brilhar. E muitos dos judeus pereceram absorvidos pela fenda da terra, de maneira que no dia seguinte grande parte dos que haviam estado contra Jesus já não estavam ali. Outros viram aparições de ressuscitados que nenhum de nós havia visto. E em Jerusalém não ficou nem uma só sinagoga dos judeus, pois todas desapareceram naquele terremoto. Assim, estando fora de mim devido àquele pânico e tolhido ao extremo por um horrível tremor, fiz para vossa excelência o relatório escrito do que meus olhos viram naqueles momentos. E, além disso, rememorando o que os judeus fizeram contra Jesus, remeto este relatório à vossa divindade. Oh Senhor!”

 

CORRESPONDÊNCIA ENTRE PÔNCIO PILATOS E HERODES

CARTA DE PILATOS A HERODES

Pilatos, governador de Jerusalém, saúda o tetrarca Herodes.

Não foi nada bom o que fiz sob a tua orientação, naquele dia em que os judeus apresentaram-me Jesus, o chamado Cristo. Pois da mesma maneira que foi crucificado, assim também ressuscitou no terceiro dia de entre os mortos, como alguns acabam de anunciar-me dentre eles o centurião. Eu próprio decidi enviar uma expedição até a Galiléia e todos testemunham havê-lo visto em seus próprio corpo conservando o mesmo semblante. Chegou a deixar-se ver por mais de quinhentas pessoas, com a mesma voz e com idênticos ensinamentos. Estes indivíduos têm andado por aí dando testemunho disso e, longe de vacilar, têm pregado a sua ressurreição como um extraordinário fenômeno e anunciado um reino eterno, a ponto de os céus e a terra parecerem alegrar-se com seus santos ensinamentos.

E saberás que Procla, minha mulher, dando crédito às aparições que teve d’Ele, quando eu estava quase mandando crucificá-lo devido à tua instigação, deixou-me sozinho e foi-se com dez soldados e Longinos, o fiel centurião, para contemplar o seu semblante, como se tratasse de um grande espetáculo. E viram-no sentado numa plantação, rodeado de grande turba e ensinando as magnificências do Pai; de forma que estavam todos fora de si e cheios de admiração, pensando se aquele que havia padecido o tormento da crucificação havia ressuscitado de entre os mortos.

E, enquanto todos O estavam observando com grande atenção, Ele divisou Procla e Longinos e dirigiu-se até eles nos seguintes termos: “Ainda não acreditais em mim? Por

 

 

 

ventura não foste tu que fizeste a guarda durante a minha paixão e vigiaste meu sepulcro? E tu, mulher, não é aquela que enviaste ao teu esposo uma carta sobre mim? […] o testamento de Deus que o Pai dispôs. Então, eu que fui crucificado e sofri muitas coisas, vivificarei através da minha morte, tão vossa conhecida, toda a carne que pareceu. Agora, então, saberás que todo aquele que acreditou em Deus Pai e em mim não perecerá, pois eu fiz desaparecer as dores da morte e atravessei o dragão de muitas cabeças. E, por ocasião da minha futura vinda, cada um ressuscitará com o mesmo corpo e alma que tem agora e abençoará o meu Pai, o Pai daquele que foi crucificado na época de Pôncio Pilatos”.

Ao ouvir dizer tais coisas, tanto minha mulher, Procla, como o centurião que teve a seu encargo a execução de Jesus, bem como os soldados que haviam ido em sua companhia, puseram-se a chorar, cheios de aflição, e vieram até minha presença contar-me essas coisas. Eu, de minha parte, depois de ouvi-las, relatei-as aos meus grandes comissários e companheiros de milícia; estes, cheios de aflição e ponderando o mal que haviam feito contra Jesus, puseram-se a chorar; e mesmo assim eu, compartilhando a dor da minha mulher, estou entregue ao jejum e durmo sobre a terra. Nesse instante veio o Senhor e levantou-nos do chão a mim e à minha mulher; então fixei meus olhos nEle e vi que seu corpo ainda conservava as equimoses. E Ele colocou suas mãos sobre os meus ombros, dizendo: “Bem-aventurado chamar-te-ão todas as gerações e povos, porque na tua época morreu e ressuscitou o Filho do Homem e agora subirá aos céus e sentar-se-á acima de tudo. E todas as tribos da terra dar-se-ão conta de que eu sou aquele que julgará os vivos e os mortos no último dia”.

 

CARTA DE HERODES A PILATOS

Herodes, tetrarca dos galileus, saúda o governador dos judeus, Pôncio Pilatos.

Estou tomado de uma grande aflição, conforme dizem as Sagradas Escrituras, pelas coisas que passarei a relatar-te, assim como penso que tu, de tua parte, afligir-te-ás ao lê- las. Saiba que minha filha Herodíades, a quem eu amo ardentemente, faleceu quando brincava junto à água coberta de gelo e ele quebrou-se. Seu corpo afundou e a cabeça, decepada pelo gelo, ficou na superfície. Então sua mãe a recolheu, pois o restante do corpo perdeu-se nas águas. Agora, minha mulher, chorando, aperta a cabeça nos joelhos, e toda a minha casa está entregue a uma dor sem fim.

Eu, de minha parte, encontro-me rodeado de muitos males, desde o momento em que soube que tu havias desprezado a Jesus, e quero pôr-me a caminho somente para vê-lo, adorá-lo e escutar alguma palavra de Seus lábios, pois pratiquei muitas maldades contra Ele e contra João Batista; certamente estou recebendo com toda a justiça o que mereço, pois meu pai derramou sobre a terra muito sangue de filhos alheios por causa de Jesus, e eu, por minha vez, degolei João, aquele que O batizou.

Justos são os desígnios de Deus, porque cada qual recebe a sua recompensa de acordo com os seus desejos. Assim, pois, já que te é dado ver Jesus novamente, luta agora por mim e diz-lhe uma palavra a meu favor; porque a vós, os gentios, vos foi entregue o Reino, conforme o que disseram Cristo e os profetas.

Asbonius, meu filho, está na agonia da hora da morte, preso a uma doença extenuante, já faz alguns dias, Eu, de minha parte, encontro-me gravemente doente, submetido ao tormento da hidropisia, ao ponto de saírem vermes da minha boca. Minha mulher chegou até a perder o olho esquerdo devido à desgraça que se abateu sobre minha casa. Justos são os desígnios de Deus, porquanto ultrajamos o Olho da Retidão. Não há paz para os que cometem maldades, disse o Senhor. Pois grande aflição abateu-se contra os sacerdotes e os

 

 

 

escribas da lei. A morte chegará depressa a eles e ao senado dos filhos de Israel, pois iniquamente puseram suas mãos sobre o Justo. Tudo isto veio a cumprir-se na consumação dos séculos; e assim, as nações gentias receberão como herança o Reino de Deus, enquanto que os filhos da luz serão arremessados fora por não terem observado o que fora pregado com relação ao Senhor e ao seu Filho. Cinja, pois, teus rins, e abraça a Justiça, tu e tua mulher, lembrando Jesus dia e noite; e o Reino pertencerá a vós, os gentios, pois que os escolhidos rejeitaram o íntegro. E se é que há lugar para minhas súplicas, ó Pilatos, visto que estivemos no poder ao mesmo tempo, dá-nos sepultura, a mim e aos da minha casa, uma vez que queremos ser sepultados por ti e não pelos sacerdotes, aos quais em breve os espera o Juízo, segundo as Escrituras, na vinda de Jesus Cristo. Adeus a ti e a Procla, tua mulher.

Enviei-te os brincos de minha filha e meu próprio anel, para que sejam uma memória de minha morte, pois já sinto os vermes aflorarem-se-me em todo meu corpo, pois que estou recebendo o castigo temporal; mas tenho mais medo do julgamento que advirá, pois em ambos estarei diante das obras do Deus vivo. Mas esse julgamento, que é temporal, é só durante um período, mas o outro, será eterno.

Fim da Carta de Herodes a Pilatos, o Governador.

 

JULGAMENTO E CONDENAÇÃO DE PILATOS

A carta chegou a Roma e foi lida a César na presença de não poucas pessoas. E todas ficaram atônitas ao ouvir que, por causa do delito de Pilatos, as trevas e o terremoto haviam afetado toda a terra. E César, encolerizado, enviou soldados para que prendessem Pilatos.

Conduzindo Pilatos a Roma, e tendo César sido inteirado de sua chegada, sentou-se o imperador no templo   dos deuses, à frente do senado, acompanhado de todos os militares e da multidão que integrava suas forças, e deu ordens para que Pilatos se aproximasse e ficasse em pé. E a seguir disse-lhe: “Por que tiveste a ousadia   de fazer tais coisas, monstro de impiedade, depois de haveres visto prodígios como os que fazia aquele homem? Por teres te atrevido a cometer tal vilania, causaste a ruína do universo”.

Mas Pilatos replicou: “Oh imperador!, eu não sou culpado disto; os incitadores e responsáveis são os judeus”. E perguntou César: “E quem são eles?” Pilatos respondeu: “Herodes, Arquelao, Filipo, Anás. Caifás e toda a turba do judeus.” César retrucou: “E por que tu te curvaste ao propósito deles?” Pilatos disse: “Sua nação é revoltada e insubmissa; não se submete ao vosso império. Ao que César replicou: “Em lugar de tê-lo entregue, deverias tê-lo colocado em lugar seguro e O enviado a mim, e não deixar que eles te persuadissem a crucificar um ser notável como este, que era justo e que fazia prodígios tão bons como os que fazias constar de teu relatório. Pois sinais como estes permitem conhecer que Jesus era o Cristo, o rei dos judeus”.

Mal César acabara de mencionar o nome de Cristo e toda a caterva de deuses desmoronou e ficou reduzida a uma nuvem de pó que ocupou o recinto no qual César estava sentado na companhia do senado. E o povo que estava na presença de César ficou amedrontado ao ouvir pronunciar o nome e presenciar a queda daqueles deuses, e, aterrado pelo medo, correu para casa, cheio de admiração pelo que acabava de presenciar. Então César ordenou que Pilatos fosse submetido a uma severa vigilância, de forma que ele pudesse conhecer a verdade sobre o que se relacionava a Jesus.

No dia seguinte César sentou-se no Capitólio juntamente com o senado em peso e propôs-se a interrogar Pilatos novamente. Então César disse: “Dize a verdade, monstro de impiedade, pois, pela ímpia ação que levantaste a cabo contra Jesus, tua má conduta veio

 

 

 

manifestar-se até aqui, com os deuses fazendo-se em pedaços. Dize-me, então, quem é aquele crucificado, já que seu nome trouxe a perdição até aos nossos deuses?” Pilatos respondeu: “Efetivamente, tudo o que d’Ele se fala é verdadeiro; eu próprio, ao ver suas obras, cheguei a persuadir-me de que aquela notável pessoa era de uma categoria superior aos deuses que nós veneramos”. Então César perguntou: “Como, então, tiveste a ousadia de fazer aquilo contra Ele, conhecendo-O como O conhecias? Ou o fato é que tramavas algum mal contra o meu império?” Mas Pilatos respondeu: “Fiz isto pela iniqüidade e pela sublevação desses judeus sem lei e sem Deus”.

Então, encolerizado, César pôs-se a deliberar com todo o senado e com seu exército. E mandou escrever um édito contra os judeus nos seguintes termos: “A Liciano, governador da província oriental, saúde. Chegou ao meu conhecimento o ato atrevido e ilegal que teve lugar em nosso tempo por parte dos judeus que habitam Jerusalém e as cidades circunvizinhas, até o ponto de terem obrigado Pilatos a crucificar um certo deus chamado Jesus, crime tão horrendo que por ele o universo, envolto em trevas, quase ia sendo arrastado à ruína. Então, faz cair cobre eles tuas forças, e declara a escravidão por meio do presente édito. Sê obediente à ordem de atacá-los e esparramá-los pelo mundo; reduz à servidão os judeus em todas as nações, e, depois de expulsar de toda a Judéia até a relíquia mais insignificante de sua raça, faz com que nada deles se conserve, cheios como estão de maldade”.

Tendo este édito chegado ao Oriente, Liciano obedeceu ao terrível teor da ordem e exterminou a nação inteira dos judeus; e os que ficaram na Judéia, lançou-os à diáspora das nações para serem escravos, de maneira que chegou ao conhecimento de César o que Liciano havia feito contra os judeus no Oriente, o que o agradou.

E César dispôs-se novamente a julgar Pilatos. Depois mandou que um chefe chamado Álbio lhe cortasse a cabeça dizendo: “Da mesma maneira que este levantou a sua mão contra aquele homem justo chamado Cristo, de maneira semelhante este também cairá sem remissão”.

Mas Pilatos, quando chegou ao lugar indicado, pôs-se a orar em silêncio desta forma: “Senhor, não me faças perder na companhia dos perversos hebreus, pois eu não teria levantado a minha mão contra Ti não fosse o povo dos judeus iníquos, que se rebelaram contra Ti; mas sabes que agi sem saber. Assim, então, não me faças perder por este pecado, porém sê benigno comigo, ó Senhor, e com Tua serva Procla, que está ao meu lado nesta hora da minha morte e a quem dignaste designar como profetisa da Tua futura crucificação. Não condenes também a ela pelo meu pecado, mas perdoa-nos e conta-nos dentre os Teus escolhidos”.

E eis que, após Pilatos terminar sua oração, sobreveio uma voz que dizia: “Bem- aventurado chamar-te-ão as gerações e as pátrias das gentes, porque no teu tempo cumpriram-se todas estas coisas que tinham sido ditas pelos profetas sobre mim; e haverás de ser testemunha por ocasião da minha segunda vinda, quando irás julgar as doze tribos de Israel e aqueles que não reconheceram meu nome”. E o executor lançou por terra a cabeça de Pilatos, e eis que um anjo do Senhor recebeu-a. E Procla, sua mulher, transbordando de alegria ao ver o anjo que vinha para receber a cabeça dele, entregou também seu espírito no mesmo instante, e foi sepultada juntamente com seu marido.

 

MORTE DE PILATOS, O QUE CONDENOU JESUS

 

 

 

Tibério César, imperador dos romanos, encontrando-se acometido de uma grave doença e tendo-se inteirado de que em Jerusalém havia um médico chamado Jesus, o qual curava todas as doenças somente com a sua palavra, ignorando que os judeus e Pilatos Lhe haviam dado a morte, expediu a seguinte ordem a Volusiano, alguém muito chegado a ele: “Vai o mais cedo possível até o outro lado do mar e diz a Pilatos, meu servidor e amigo, que me envie este médico para que me restitua o estado de saúde no qual me encontrava antes”.

Volusiano, ouvindo a ordem do imperador, partiu no mesmo instante e chegou até Pilatos, de acordo com a ordem recebida. E contou ao mencionado Pilatos, o que havia sido encarregado por Tibério César, dizendo: “Tibério César, imperador dos romanos, teu senhor, ao tomar conhecimento de que se encontra nesta cidade um médico capaz de curar todas as doenças somente com a sua palavra, roga-te encarecidamente que o envies para que o cure de seu mal. Quando Pilatos ouviu isto, ficou muito atemorizado, descobrindo que O havia feito matar por inveja. Então, assim respondeu Pilatos ao citado mensageiro: “Aquele homem era um malfeitor e levava todo o povo atrás de si. Motivo pelo qual, depois de promover um conselho entre os sábios da cidade, mandei que fosse crucificado”. Quando o mensageiro em questão voltava para sua casa, encontrou-se com uma certa mulher chamada Verônica, que havia conhecido Jesus, e disse-lhe: “Mulher, havia um certo médico residente nesta cidade, que somente com a sua palavra curava os doentes, por que os judeus o mataram?” Mas ela começou a chorar, dizendo: “Ai de mim! O senhor, era o meu Deus e me Senhor, a quem Pilatos por inveja entregou, condenou e mandou crucificar”.

Então ele, embargado por uma dor profunda, disse: “Sinto-o enormemente, porque não vou poder cumprir a missão que meu senhor me confiou”. Verônica disse-lhe: “Quando meu Senhor ia pregar, eu me sentia mal, já que ficava privada da sua presença; então que me fizessem um retrato para que, enquanto eu não pudesse desfrutar sua companhia, pudesse ao menos consolar-me com a figura da sua imagem. E, estando eu a caminho para levar o lenço ao pintor para que O desenhasse, meu Senhor veio ao meu encontro e perguntou-me onde ia. Quando manifestei-lhe meu propósito, pediu-me o lenço e mo devolveu com a imagem de seu venerável rosto. Portanto, se teu senhor olhar sua imagem com devoção, ver-se-á imediatamente agraciado com o benefício da cura”. Então ele disse- lhe: “Um tal retrato pode ser adquirido com ouro ou com prata?” Ela respondeu: “Não, tão somente com um piedoso afeto de devoção. Irei contigo e levarei a imagem para que César a veja; depois voltarei”.

Então, veio Volusiano a Roma em companhia de Verônica e disse ao imperador Tibério:

“Aquele Jesus, a quem tu já ha algum tempo vens desejando ver, foi entregue por Pilatos e pelos judeus a uma morte injusta e por inveja foi pregado no patíbulo da cruz. Porém veio em minha companhia certa senhora que traz consigo um retrato do próprio Jesus; se tu o olhares com devoção, obterás de imediato o benefício da tua cura”. Então César fez com que o caminho fosse atapetado com panos de seda e ordenou que a imagem lhe fosse apresentada. E, no instante em que a olhou, recobrou sua antiga saúde.

Em conseqüência, Pôncio Pilatos foi detido por ordem de César e trazido a Roma. Quando o imperador tomou conhecimento da sua chegada, sentiu-se dominado por uma enorme fúria contra ele e ordenou que o levassem à sua presença. Deve-se esclarecer que Pilatos havia trazido consigo a túnica de Jesus, feita de uma só peça, dádiva que levou à presença do imperador. Assim que o viu, o imperador sentiu-se destituído de toda a sua ira,

 

 

 

levantou-se imediatamente diante dele e não ousou em dizer uma única palavra dura. E, assim, ele, que na sua ausência parecia tão feroz e terrível, agora, na sua presença, estava até certo ponto manso. Mas, assim que o despediu, começou a exaltar-se terrivelmente contra ele, chamando-se a si mesmo, aos gritos, de miserável por não haver manifestado a indignação de seu peito. E no mesmo instante   fez com que o chamassem novamente, jurando e declarando que era filho da morte e que não era lícito que ele vivesse sobre a terra. Porém, quando o viu de novo, saudou-o imediatamente e sentiu-se destituído de novo de toda a ferocidade de sua alma.

Todos, até ele próprio, estavam admirados com o fato de ele encolerizar-se na ausência de Pilatos, enquanto que na sua presença não era capaz de dizer sequer uma palavra áspera. Finalmente, por inspiração divina, ou talvez por conselho de algum cristão, mandou que o despojassem daquela túnica. No mesmo instante recobrou sua antiga feracidade de alma contra ele. Grandemente admirado com esse fato, o imperador ficou sabendo que aquela túnica havia pertencido a Jesus. Então ordenou que atirassem Pilatos na cadeia, enquanto o conselho de sábios deliberava o que deveria ser feito com ele. Poucos dias depois ditou-se a sentença contra Pilatos para que fosse levado a uma morte extremamente infamante. Quando isto chegou aos ouvidos de Pilatos, ele próprio suicidou-se com uma faca, e com esta morte pôs fim à sua vida.

Ao tomar conhecimento do ocorrido, César disse: “Na verdade morreu ignominiosamente, já que sua própria mão não o perdoou”. Então amarraram-no em uma enorme pedra e o atiraram nas profundezas do Tibre. Aconteceu, porém, que alguns espíritos imundos e malignos, aproveitando-se daquele corpo nas suas próprias condições, moviam-se naquelas águas e atraíram para elas raios e tempestades, trovões e granizo, até o ponto de todos assustarem-se e sentirem um grande temor. Por causa disto os romanos tiraram-no do rio Tibre e levaram-no ao som de galhofas até Viena e o arremessaram nas profundezas do Ródano, já que Viena significa “Caminho para a Geena” (inferno), por ser naquele tempo um lugar maldito. Mas também ali os espíritos maus apareceram, fazendo as mesmas coisas, então a população, não suportando uma invasão tão grande de demônios, atirou para longe aquele maldito fardo e diligenciou para que recebesse sepultura no território de Lausane. Os habitantes desta região, sentindo-o excessivamente conturbados pelas invasões, atiraram-no por sua vez longe deles, num poço rodeado de montanhas, lugar que, se dermos crédito ao que algumas pessoas contam, dizem que ainda é agitado por algumas maquinações diabólicas.

 

A SENTENÇA DE PILATOS

“Cópia da sentença dada por Pôncio Pilatos, governador da Judéia no ano 18 (sic) de Tibério César, Imperador de Roma. Encontrada na cidade de Aquila, no reino de Nápoles. Sentenciou Jesus Cristo, Filho de Deus e da Virgem Maria, à morte na cruz, no meio de dois ladrões, no dia 25 de março. Achada milagrosamente dentro de uma belíssima pedra, na qual estavam duas caixinhas: uma, de ferro, tinha dentro dela outra de finíssimo marfim, onde estava a sentença, em letra hebraica, em pergaminho, do seguinte teor:

“No ano XVIII de Tibério César, imperador romano e de todo o mundo, Monarca Invencível na Olimpíada c.xxi, na Clíade xxiv e na Criação do Mundo, segundo os números e cálculos dos Hebreus, quatro vezes m.c.Ixxxvii, e da propagação do Império Romano l.xxiii, da libertação da escravidão da Babilônia m.cc.xi, sendo Cônsules do Povo Romano Lúcio Pisano e Maurício Pisarico; Procônsules Lúcio Balesma, público Governador da Judéia, e Quinto Flávio, sob o regimento e Governo de Jerusalém, Governador gratíssimo

 

 

 

Pôncio Pilatos, regente da baixa Galiléia, e Herodes Antipas, Pontífices do Sumo Sacerdote Anás, Alit Almael o Mago do Templo, Roboan Ancabel, Franchino Centurião, e Cônsules Romanos e da Cidade de Jerusalém Quinto Cornélio Sublima e Sexto Pontílio Rufo; no dia xxv do mês de Março. “EU, Pôncio Pilatos, aqui Presidente Romano dentro do Palácio da Arquipresidência, julgo, condeno e sentencio à morte a Jesus chamado pela plebe Cristo Nazareno, e de pátria Galiléia, homem sedicioso de Lei Mosaica, contrário ao grande Imperador Tibério César; e determino, e pronuncio, pela presente, que sua morte seja na cruz, e pregado com cravos como se usa com os réus, porque aqui congregando e juntando muitos homens ricos e pobres não parou de causar tumultos por toda a Judéia, fazendo-se filho de Deus e Rei de Jerusalém, ameaçando trazer a ruína para esta Cidade, e para seu Sagrado Templo, negando o tributo a César, e tendo ainda tido o atrevimento de entrar com palmas, em triunfo, e com parte da plebe, na Cidade de Jerusalém e no Sagrado Templo. E ordeno que meu primeiro Centurião Quinto Cornélio leve publicamente Jesus Cristo pela cidade, amarrado e açoitado, e que seja vestido de púrpura e coroado com alguns espinhos, com a própria Cruz nos ombros para que seja exemplo a todos os malfeitores; e com ele que sejam levados dois ladrões homicidas, e sairão pela Porta Sagrada, agora Antoniana, e que leve Jesus ao monte público da Justiça chamado Calvário, onde crucificado e morto fique o corpo na Cruz, como espetáculo para todos os malvados; e que sobre a Cruz seja colocado o título em três idiomas, e em todos três (Hebraico, Grego e Latim) diga: IESUS NAZAR. REX IUDAEORUM.

“Da mesma maneira, ordenamos que ninguém de qualquer estado ou qualificação atreva-se temerariamente a impedir tal Justiça por mim ordenada, administrada e executada com todo o rigor segundo os decretos e Leis Romanas e Hebréias, sob pena de rebelião ao Império Romano Testemunhos da Sentença: pelas 12 tribos de Israel, Rabain Daniel, Rabain seg.12, Joannin Bonicar, Barbasu, Sabi Potuculam. Pelos Fariseus, Búlio, Simeão, Ronol, Rabini, Mondagul, Boncurfosu. Pelo Sumo Sacerdócio, Rabban, Nidos, Boncasado, Notários desta publicação; pelos Hebreus, Nitanbarta; Pelo Julgamento, e pelo Presidente de Roma Lúcio Sextilio, Amásio Chlio.”

 

A VINGANÇA DO SALVADOR

Nos dias do imperador Tibério César, sendo Herodes tetrarca, sob o domínio de Pôncio Pilatos, Cristo foi entregue pelos judeus e declarado inocente por Tibério.

Por aqueles dias, estava Tito de chefe de estado, sob as ordens de Tibério, na região de Equitânia, em uma cidade da Líbia chamada Burgidalla. Sabe-se que Tito tinha uma chaga na parte direita do nariz, originada, diz-se, por um câncer, que tornava seu rosto desfeito até o olho.

Naquele tempo saiu da Judéia um homem chamado Natan, filho de Naum. Este era um ismaelita que ia de região em região e de mar em mar, por todos os confins da terra. Natan vinha como enviado da Judéia ao imperador Tibério, sendo portador de um tratado que haviam feito com a cidade de Roma. Nota-se que Tibério estava doente, cheio de úlceras, febres malignas e nove tipos de lepra.

Natan tinha a intenção de dirigir-se a Roma, mas soprou o vento do norte e mudou sua rota, fazendo com que ele chegasse a um porto da Líbia. Tito, que viu a neve chegar, soube que vinha da Judéia. E todos encheram-se de admiração e concordaram que nunca haviam visto nenhuma embarcação chegar ali em semelhantes condições.

 

 

 

Então Tito fez com que o chefe da nave fosse chamado e perguntou-lhe quem era. Ele respondeu: “Eu sou Natan, filho de Naum, de origem ismaelita, e vivo na Judéia sob o domínio de Pôncio Pilatos. Agora sou enviado a Tibério, imperador romano, com o objetivo de colocar em suas mãos um tratado proposto pela Judéia. Mas um forte vento jogou-se sobre o mar, e eis-me aqui numa região para mim desconhecida”.

E Tito disse: “Se porventura fores capaz de encontrar algum medicamento, seja de misturas ou de ervas, que sirva para curar-me a ferida que, como vês, tenho no rosto, de maneira que eu possa sarar e recuperar minha antiga saúde, cobrir-te-ia de favores”.

Natan respondeu: “Senhor, eu, de minha parte, não sei nem conheço coisas semelhantes a essas que me indicas. Não obstante, se estivesses estado há algum tempo em Jerusalém, ali terias encontrado um profeta eleito, cujo nome era Emmanuel (pois Ele há de salvar o povo dos seus pecados). Ele operou seu primeiro milagre em Canaã da Galiléia, convertendo a água em vinho; e com sua palavra limpou os leprosos, fez o demônio fugir, ressuscitou três mortos, libertou uma mulher surpreendida em adultério, condenada pelos judeus a ser lapidada, e a uma outra mulher chamada Verônica, que sofria de hemorragias desde os seus onze anos e que se aproximou dele por trás, tocando a fímbria de suas vestes, curou-a também; e com cinco pães e dois peixes saciou a cinco mim homens, sem contar mulheres e crianças, ficando doze cestos de vime de sobras. Todas estas e muitas outras aconteceram antes de sua paixão. Depois de sua ressurreição vimo-lo com o mesmo corpo que antes havia tido”.

Então Tito disse: “Como ressuscitou de entre os mortos? Então Ele esteve morto’? Natan respondeu: “Sem dúvida alguma ele morreu; foi dependurado numa cruz e depois morto despendurado dela; esteve três dias no sepulcro; depois ressuscitou de entre os mortos e baixou aos infernos, onde libertou os patriarcas, profetas e a todo humano com descendência; depois apareceu aos discípulos e partilhou a refeição com eles; e, finalmente, viram-no subir ao céu. De maneira que é verdade tudo o quanto venho dizendo-lhes. Eu mesmo O vi com meus próprios olhos, bem como a casa inteira de Israel”. Então Tito exclamou: “Ai de ti, imperador Tibério, cheio de úlceras e cercado de lepra, por haveres cometido um tal escândalo durante o teu reinado; por haveres promulgado algumas leis na Judéia, terra natal de Nosso Senhor Jesus Cristo, as quais serviram para prender o rei e matar o governador dos povos, sem que O fizessem vir até nós para que limpasse de ti a lepra e a mim me curasse de minha doença. Porque se isso houvesse acontecido diante de meus olhos, com minhas próprias mãos teria dado a morte aos corpos daqueles judeus e os teria pendurado num pedaço de pau por terem acabado com o meu Senhor sem que meus olhos fossem dignos de ver o seu rosto”.

E, no mesmo instante em que pronunciou essas palavras, a ferida do rosto de Tito desapareceu, deixando sua carne e seu rosto novamente curados. E todos os doentes que ali estavam recuperaram a saúde naquele mesmo momento. E Tito, junto com todos eles, exclamou aos brados: “Meu rei e meu Deus, já que Tu me curaste sem que jamais O houvesse visto, manda-me ir navegando sobre as águas até a terra onde nasceste para que eu Te vingue dos teus inimigos; ajuda-me, Senhor, para que eu possa eliminá-los e vingar a tua morte; Tu, Senhor, os entregarás em minhas mãos”.

E, dizendo isto, mandou que o batizassem, para o que chamaram Natan e ele disse-lhe: “Como viste serem batizados aqueles que acreditavam em Cristo, vem e batiza-me em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo, absolve-me, pois creio firmemente em Nosso Senhor Jesus Cristo com todo o meu coração e com toda a minha alma, porque não há nenhum outro em nenhuma parte da terra que me tenha criado e que me tenha curado”.

 

 

 

E dito esto, enviou legados a Vespasiano par avisá-lo que viesse o mais rapidamente possível com os indivíduos mais fortes dispostos para a guerra.

Então Vespasiano tomou para si cinco mil homens armados e foi ter com Tito. E, ao chegar á Líbia, disse-lhe: “A que se deve o fato de me haveres feito vir até aqui”? Ele respondeu: “Hás de saber que Jesus veio a este mundo e nasceu na Judéia, num lugar chamado Belém; que os judeus entregaram-no e foi flagelado e crucificado no monte Calvário, e que, finalmente, manifestou-se aos seus discípulos e eles acreditaram Nele. Nós, de nossa parte, queremos nos tornar discípulos seus. Agora, então, marcharemos e eliminaremos os seus inimigos da superfície da terra para que se dêem conta de que não há quem se assemelho a Nosso Senhor em toda a face da terra”.

Assim, então, tomada a resolução, saíram da Líbia e embarcaram rumo a Jerusalém. Aí chegando, sitiaram o reino dos judeus e começaram a provocar a sua ruína. Quando os reis dos judeus tomaram conhecimento do que faziam e da devastação da terra, o medo apoderou-se deles e ficaram consternados. E Arquelao, deixando-se levar pela comoção em suas palavras, assim falou a seu filho: “Olha, filho, encarrega-te de meu reino e da sua administração; além disso, ouve o conselho dos demais reis que estão na terra de Judá, de maneira que possas escapar de nossos inimigos”. E, dizendo isso, desembainhou sua espada e jogou-se sobre ela; depois vergou a espada mais penetrante que possuía, fundiu-a em seu corpo e morreu.

Então seu filho aliou-se aos outros reis que estavam sob as suas ordens. E, depois de deliberar entre si, dirigiram-se todos para o centro de Jerusalém, na companhia dos nobres que haviam assistido ao conselho, e ali permaneceram durante sete anos

Tito e Vespasiano, por seu lado, tomaram a determinação de sitiar a cidade. E assim fizeram. Passados os sete anos, o problema da fome agravou-se muito e, forçados pela falta de pão, começaram a comer a terra.

Então todos os soldados pertencentes aos quatro reis reuniram-se e decidiram: “De qualquer maneira nós vamos morrer. Que nos fará Deus? E de que nos adianta continuar vivendo, se os romanos vieram para apoderar-se de nossa terra e de nossa nação? Será melhor que tiremos nossas próprias vidas, para que os romanos não possam dizer que foram eles que nos mataram e nos derrotaram”. E, então, tiraram suas espadas e feriram-se, morrendo entre eles doze mil homens.

E assim, por causa dos cadáveres daqueles mortos, produziu-se um grande mal cheiro na cidade. Os reis foram tomados por um pânico mortal e não puderam agüentar o odor deles, nem dar-lhe sepultura, nem atirá-los fora da cidade. E disseram entre si: “Que havemos de fazer? Na verdade nós matamos Cristo, mas já fomos, de nossa parte, entregues à morte. Separemo-nos de nossas cabeças e entreguemos as chaves da cidade aos romanos, pois Deus já nos atirou nas mãos da morte”. E ato seguido subiram nas muralhas da cidade e puseram-se a gritar, dizendo aos berros: “Tito e Vespasiano, tomais as chaves da cidade que o Messias, chamado Cristo, acaba de entregar-lhes”.

E assim dizendo entregaram-se a Tito e Vespasiano, exclamando: “Julgai-nos, pois vamos morrer, já que julgamos o Cristo e o entregamos sem nenhuma razão”. Então Tito e Vespasiano os aprisionaram. Depois lapidaram alguns e penduraram outros na cruz, com os pés para cima e a cabeça para baixo, e feriram-nos a golpes de lança; mas outro puseram à venda e outros tantos repartiram entre si, em quatro partes, como eles haviam feito com as vestes do Senhor. E disseram: “Eles venderam Cristo por trinta moedas de prata; vendamos da mesma forma trinta deles por um só dinheiro”. E assim o fizeram. Depois apoderaram-se de todas as terras da Judéia e de Jerusalém.

 

 

 

Fizeram então uma investigação sobre o retrato da face do Senhor, sobre como poderiam encontrá-lo. E ouviram dizer que estava em poder de uma mulher chamada Verônica. Depois   detiveram Pilatos e meteram-no na cadeia, onde haveria de ser custodiado por quatro pelotões de soldados, quatro de cada vez, postados à porta da prisão.

Ato seguido enviaram seus legados a Tibério, imperador de Roma, para que os enviaste a Velosiano. E o imperador lhe disse: “Leva contigo tudo que seja necessário para que te faças ao mar e navegues até a Judéia em busca de algum discípulo daquele que se chamava Cristo e Senhor, de maneira que ele venha até mim e em nome de Deus core-me da lepra e das doenças que duramente me acometem e de minhas chagas, pois estou muito abatido. Além disso, contra os reis de Judá, submetidos ao meu império, manda teus açoites e terríveis instrumentos de tortura, pois mataram Jesus Cristo Nosso Senhor, e condena-os à morte. E se encontrares um homem capaz de livrar-me desta doença, acreditarei em Cristo, Filho de Deus, e far-me-ei batizar também em seu nome. “Velosiano disse: “Senhor imperador, se eu encontrar um homem capaz de ajudar-nos e libertar-nos, que recompensa devo prometer-lhe?” Tibério disse: “Que sem dúvida alguma terá em suas mãos a metade do império.

Então Velosiano partiu imediatamente, subiu no barco, levantou âncora e fez-se ao mar.

A viagem marítima durou oito dias, em cujo prazo chegou a Jerusalém. Imediatamente citou alguns dos judeus para que se apresentassem diante dele e ordenou uma diligente investigação sobre o que havia sido feito com Jesus Cristo.

Então José de Arimatéia e Nicodemus apresentaram-se simultaneamente. Este último disse: “Eu tive ocasião de vê-lo e estou seguro de que Ele é o salvador do mundo”, José, por sua vez, disse-lhe: “Eu baixei-O da cruz e coloquei-O num sepulcro novo, escavado na rocha. Razão pela qual os judeus levaram-me preso sexta-feira à tarde. E no Sabat seguinte, enquanto estava orando, a casa ficou suspensa pelos seus quatro ângulos e vi Nosso Senhor Jesus Cristo como um relâmpago e luz, e, consternado, caí por terra. E ouvi uma voz que me dizia: “Olhai-me, pois eu sou Jesus, aquele cujo corpo tu sepultaste em teu próprio sepulcro’. Eu lhe disse: “Mostra-me o sepulcro onde eu O coloquei’. Então Jesus tomou-me pela mão com sua direita e levou-me ao lugar onde eu O havia sepultado.”

Veio também uma mulher chamada Verônica e disse-lhe: “Eu, de minha parte, toquei- lhe a fímbria das vestes no meio da multidão, pois fazia já doze anos que padecia de hemorragias, e no mesmo instante ele me curou”.

Então Velosiano disse a Pilatos: “E tu, ímpio e cruel, por que mataste o Filho de Deus”? Mas ele respondeu: “Acontece que o seu povo e seus pontífices Anás e Caifás mo entregaram.” E Velosiano respondeu: “Ímpio e desalmado, és digno de uma pena cruel”. E com isto mandou-o de volta à prisão.

Finalmente, Velosiano pôs-se a procurar a pintura da face do Senhor. Disseram-lhe todos os presentes: “Certa mulher chamada Verônica tem a face do Senhor em sua casa”. Imediatamente ordenou que ela fosse levada diante dele e disse-lhe: “Tu tens em casa a face do Senhor”? Mas ela disse que não. Então Velosiano ordenou que a torturassem até que ela mostrasse a face do Senhor. finalmente, sem outro remédio, ela disse: “Eu a tenho, meu senhor, envolta em um pano limpo e todos os dias rendo-lhe homenagem”. Velosiano disse: “Dize-me onde está”. Ela então mostrou-lhe a face do Senhor. Velosiano, no momento em que a viu, prostrou-se por terra; em seguida tomou-a em suas mãos com o coração aberto e uma límpida fé e envolveu-a num lenço de ouro e assim mesmo colocou-a num estojo que selou com seu dedo. Depois formulou um juramento nos seguintes termos: “Vive o Senhor

 

 

 

Deus e pela saúde de César; nenhum homem sobre a superfície da terra a verás mais até que eu veja o rosto do meu senhor Tibério”.

Depois de haver dito estas palavras, os nobres mais proeminentes de Jerusalém pegaram Pilatos para levá-lo até o porto. Velosiano, por sua vez, pegou a face do Senhor com todos os seus discípulos e todos os seus tributos e no mesmo dia fizeram-se todos ao mar.

Esta Verônica deixou todos os seus bens por amor a Cristo e seguiu Velosiano. Este disse-lhe: “Mulher, que queres, que buscas”? Ela respondeu: “Eu busco a face do Nosso Senhor Jesus Cristo, que me iluminou, não por meus méritos, senão por sua santa piedade. Devolve-me a face de meu Senhor Jesus Cristo, pois estou morrendo por este piedoso anseio. E se não me devolveres, não a perderei de vista até ver onde irás pô-la; e saiba que eu, miserável como ninguém, servi-lo-ei todos os dias da minha vida, pois estou persuadida de que meu Redentor em pessoa vive para sempre”.

Então Velosiano mandou que Verônica fosse levada consigo até a embarcação. E, levantando âncora, empreendeu a navegação em nome do Senhor e todos fizeram-se ao mar. Mas Tito e Vespasiano subiram até a Judéia para vingar todas as nações daquela terra. E, passados os dias, Velosiano chegou a Roma e deixou sua embarcação no rio chamado Tibre, entrando em seguida na cidade. Imediatamente enviou seu mensageiro a Tibério, para que ele tomasse conhecimento de sua feliz chegada.

Quando o imperador ouviu o mensageiro de Velosiano, alegrou-se imensamente e ordenou que visse ter à sua presença. Assim que chegou, falou-lhe: “Velosiano, como foi a viagem e o que encontraste na terra da Judéia sobre Cristo e seus discípulos? Aponta-me, rogo-te, aquele que irá curar-me de minha doença, de maneira em que fique limpo desta lepra que tenho em cima de meu corpo, e no mesmo momento entregarei a ti e a ele todo o meu império”.

E Velosiano disse: “Senhor meu imperador, encontrei na Judéia teus servos Tito e Vespasiano, tementes a Deus, os quais viram-se limpos de todas as suas chagas e doenças. Averigüei também que Tito fez pendurar todos os reis e chefes da Judéia: Anás e Caifás foram lapidados, Arquelao matou-se com sua própria lança, e a Pilatos deixei-o preso em Damasco, encerrado na prisão, sob segura vigilância. Apesar de tudo, fiz investigações sobre Jesus, a quem os judeus barbaramente atacaram, armados de espadas e paus e depois crucificaram; Ele havia vindo para libertar-nos e iluminar-nos, e eles O penduraram numa cruz. E José de Arimatéia e Nicodemus levaram uma mistura de mirra e aloé, numa quantidade de umas cem libras, para ungir o corpo de Cristo; eles O baixaram da cruz e o colocaram num sepulcro novo. Mas ao terceiro dia com toda a certeza ressuscitou de entre os mortos e deixou-se ver por seus discípulos com o mesmo corpo com o qual havia nascido. Finalmente, ao final de quarenta dias, viram-no subir aos céus. Além disso, Jesus fez muitos outros milagres antes e depois da sua paixão. O primeiro foi transformar a água em vinho; depois ressuscitou os mortos, limpou os leprosos, deu visão aos cegos, curou os entrevados, exorcizou os demônios, deu audição aos surdos e fala aos mudos; a Lázaro, morto já havia quatro dias, ressuscitou-o do sepulcro; Verônica, que vinha sofrendo de hemorragias durante doze anos, curou-se somente ao tocar-lhe as vestes.

“Então agradou ao Senhor nos céus que aquele Filho de Deus, enviado a este mundo como o primogênito a ser morto na terra, enviasse um anjo seu, e enviou Tito e Vespasiano, aos quais conheci nesse mesmo lugar onde está o teu trono. E agradou ao Senhor onipotente que partissem para a Judéia e Jerusalém e que prendessem os teus súditos e os submetessem a um julgamento parecido com aquele ao qual submeteram Jesus quando O prenderam e O amarraram.

 

 

 

“E depois Vespasiano disse: “Que havemos de fazer com os remanescentes’? Tito respondeu: “Eles dependuraram Nosso Senhor em um madeiro verde e O feriram com uma lança; penduremo-los da mesma forma, nós a eles, numa madeira seca e perfuremos seus corpos com uma lança’. E assim fizeram. Então Vespasiano disse: “E que haveremos de fazer dos remanescentes’? Tito respondeu: “Eles pegaram a túnica de Nosso Senhor Jesus Cristo e dela fizeram quatro partes; peguemos, nós também, a eles e dividimo-los em quatro partes: uma para ti, outra para mim, outra para teus homens e uma última para meus servos’. E assim fizeram. E Vespasiano disse: “Dos remanescentes, que vamos haveremos de fazer’? Tito respondeu: “Aqueles judeus venderam Nosso Senhor por trinta moedas de prata: vendamos, então, nós a trinta deles por uma só moeda’. Depois prenderam Pilatos e o entregaram a mim; meti-o numa prisão em Damasco para que fosse custodiado por quatro pelotões de soldados, quatro de cada vez.

“Depois fizeram diligentes pesquisas para encontrar a face do Senhor, e encontraram

uma mulher, chamada Verônica, que possuía a mencionada efígie.”

Então o imperador Tibério disse a Velosiano: “Como a conservas”? Este respondeu: “Tenho-a envolta numa capa colocada num pano de ouro”. Tibério disse: “Traze-a e descobre diante dos meus olhos para que eu a adore sobre o chão, caindo por terra de joelhos”. Então Velosiano estendeu seu manto e o pano de ouro onde estava o lenço gravado com a face do Senhor, e o imperador Tibério pôde vê-la. Este, no instante seguinte, adorou a efígie do Senhor com o coração puro, e sua carne ficou limpa tal qual a de uma criança. E todos os cegos, leprosos, coxos, mudos, surdos, e aleijados de várias doenças, que estavam ali presentes, foram recuperando a saúde e ficaram sadios e limpos.

Porém o imperador Tibério, ajoelhado e com a cabeça baixa, considerando aquela frase: “Bem-aventurado o ventre que Te gerou, os peitos que Te amamentaram”, gemeu e disse ao Senhor entre lágrimas: “Deus do céu e da terra, não permitas que eu peque, mas sim confirma minha alma e meu corpo e coloca-os em teu reino, pois confio sempre no teu nome: livra-me de todos os males assim como livraste os três meninos do forno de fogo ardente”.

Depois o imperador Tibério disse a Velosiano: “Velosiano, viste algum daqueles homens que poderiam ter contemplado Cristo”? Velosiano respondeu: “Sim, eu O vi”. O imperador acrescentou: “E perguntaste como batizavam aos que acreditavam em Cristo”? Então Velosiano disse: “Aqui, meu senhor, temos um dos discípulos do próprio Cristo”. Assim, então, mandou que chamassem Natan para que viesse à sua presença. E Natan veio e batizou-o em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo, amém. Depois o imperador Tibério restabelecido já de todas as doenças, subiu ao seu trono e disse: “És Bendito, Senhor onipotente e louvável, que me livraste do laço da morte e me limpaste de todas as minhas iniqüidades, pois cometi, ó Senhor, muitos pecados na tua presença e não sou digno de contemplar o teu rosto”. Então o imperador Tibério foi completamente instruído sobre todos os artigos da fé.

Que o mesmo Deus Onipotente, que é rei dos reis e senhor dos que dominam, proteja- nos em sua fé, defenda-nos, livre-nos de todo o mal e perigo e, finalmente, digne-se levar- nos até a vida eterna uma vez terminada a vida temporal. E que seja bendito por todos os séculos dos séculos. Amém.