1807
O Parlamento britânico vota a abolição do comércio de escravos
A Europa do final do século xvm era uma sociedade que se encaminhava cada vez mais para a deterioração: o rico ficava cada vez mais rico, ao passo que o pobre morria de fome. Os devedores apodreciam em prisões úmidas. Os órfãos eram escravizados em fábricas. O cristianismo, em grande parte, tornara-se a religião tipicamente das classes superiores.
Na França, a frustração dos pobres fez com que explodisse a Revolução Francesa de 1789.
Entretanto, no começo do século xix, a complacência era a marca registrada da Igreja da Inglaterra, talvez porque a Grã-Bretanha tivesse evitado a revolução. O metodismo crescia entre as pessoas das classes mais humildes, mas a classe alta da sociedade permanecia praticamente intocada, exceto por um punhado de notáveis reformadores sociais. Esses cristãos — William Wilberforce, Elizabeth Fry, George Mueller, Thomas Buxton, John Venn e outros — acreditavam que sua dedicação a Cristo significava serviço à sociedade, aos pobres e aos necessitados.
Uma das principais vozes contra a escravidão no império britânico pertencia a William Wilberforce, anglicano, devoto ao Evangelho, que era também membro da Câmara dos Comuns. De acordo com a opinião geral, sua aparência e postura não causavam grande impacto, mas sua mente afiada e seu discurso eficiente foram capazes de lhe conceder o respeito tanto de amigos quanto de inimigos.
Wilberforce nasceu em 1759 e se transformou em um jovem despreocupado, dedicado à política e aos prazeres.
Aos 25 anos, viveu uma conversão plena, rededicando sua vida ao Cristo que conhecera quando menino. O momento não era oportuno: ele acabara de ser eleito para um lugar de prestígio no Parlamento. Será que essa nova devoção a Cristo colocaria um fim em sua ambição política?
O jovem William buscou o conselho de John Newton, um pastor. O famoso pregador que fora traficante de escravos, autor do famoso hino Amazing grace [Maravilhosa graça], insistiu em que Wilberforce continuasse na política. “Deus precisa de pessoas como você no Parlamento”, disse Newton. “Talvez possamos abolir a escravatura.”
Isso tornou-se uma forte paixão para Wilberforce. Em 1787, ele apresentou uma lei ao Parlamento, mas a oposição foi maior do que o previsto. Os traficantes de escravos sabiam como fazer o jogo da política: desafiavam os abolicionistas a todo instante. Wilberforce esperava um grande apoio de seu antigo colega de universidade, William Pitt, que naquela época ocupava o cargo de primeiro-ministro. Pitt, no entanto, era um moderado. Ele era favorável a mudanças graduais, e não a uma abolição total e repentina do tráfico de escravos.
Wilberforce, porém, conseguiu conquistar aliados num grupo de ativistas cristãos que ficaram conhecidos como “Facção de Clapham”, nome originário de uma vila ao sul de Londres, onde Wilberforce residia. Esses homens se tornaram líderes do movimento evangélico na Igreja da Inglaterra. Vários deles, incluindo Wilberforce, estavam envolvidos na fundação da Sociedade Missionária da Igreja e da Sociedade Bíblica Inglesa e Estrangeira.
Pitt morreu em 1806. Os abolicionistas conseguiram anexar uma cláusula a uma lei relacionada com a guerra contra a França. Isso pavimentou o caminho para a lei de 1807 que impediu o tráfico de escravos na Inglaterra. (Os EUA aprovaram uma lei similar no mesmo ano.)
Wilberforce tornou-se um herói e usou sua fama recém-conquistada para promover outras reformas sociais. Ele continuou a trabalhar favor da abolição do tráfico internacional de escravos e ajudou a estabelecer Serra Leoa como um lar para os escravos libertos.
O reformador esperava que a instituição da escravidão simplesmente se extinguisse, uma vez que o tráfico de escravos se tornara ilegal. Ele estava equivocado. Em 1823, Wilberforce realizou um esforço final para erradicar a escravidão de uma vez por todas. Ele deixou o Parlamento em 1825, mas continuou a defender a abolição. Thomas Buxton assumiu a liderança dos abolicionistas no Parlamento. Finalmente, em agosto de 1833, um mês após a morte de Wilberforce, a Câmara dos Comuns votou a libertação dos escravos e a abolição de toda espécie de escravatura.