1919
Publicação do Comentário da carta aos Romanos, de Karl Barth
No século XIX, o liberalismo enfatizou o progresso do homem e a reforma do mundo.
Mas se esse homem era tão avançado, por que promoveu uma guerra mundial? Se suas descobertas na tecnologia e na ciência eram tão eficazes, por que apontou suas armas para seus semelhantes?
As pessoas estavam apaixonadas por suas possibilidades. Os avanços alcançados na ciência pareciam transformar o mundo em um lugar menos misterioso. Em vez de procurar um Deus sobrenatural, muitos procuravam criar o paraíso na terra.
Darwin e outros cientistas questionavam os elementos sobrenaturais da Bíblia. O homem era realmente uma criação especial? Os milagres poderiam mesmo acontecer? Por que precisamos de Deus, se nós mesmos podemos controlar a natureza? A teologia liberal daquela época retratava um Deus sem ira, um Cristo feito de ética e um Reino que era plenamente deste mundo.
A Primeira Guerra Mundial, no entanto, provocou o questionamento de todas essas coisas. Como o progresso da Europa cristã fora colocado em dúvida, muitos passaram a enxergar a natureza falida do pensamento liberal.
Um desses homens foi um pastor chamado Karl Barth. Confrontado com as atrocidades da guerra, o pastor liberal voltou-se para a carta de Paulo aos Romanos. O que ele encontrou ali mudaria sua fé e criaria uma sublevação nos remanescentes da teologia de Agostinho, Lutero e Wesley.
Sua obra Comentário da carta aos Romanos — que foi chamada “uma granada no terreno da teologia liberal” — descreveu Deus como soberano e transcendente. A queda do homem, mostrada em Gênesis 3, é real, disse Barth. Ali, todo o ser do homem estava atrelado ao pecado, e ele não era mais capaz de descobrir a verdade de Deus por si mesmo. Deus precisava se revelar ao homem, e ele faz isso por intermédio de Jesus Cristo.
A reafirmação de doutrina por Barth, que usou termos clássicos protestantes, causou muita discussão. Em 1930, o pastor já se tornara professor de teologia na Alemanha.
Barth, com outros da Igreja Confessante, escreveu grandes trechos da Declaração Barman, que chamava os cristãos a se opor às inverdades que Hitler declarava sobre a igreja. Um ano depois, em 1935, Barth foi expulso da Alemanha e seguiu para Basiléia, na Suíça, a fim de ensinar Teologia. Escreveu com grande intensidade durante o período que passou ali, incluindo sua obra principal, os treze volumes da Dogmática eclesiástica, obra-prima do protestantismo.
As idéias de Barth se tornaram a base da neo-ortodoxia. Essa teologia do século xx é antiliberal em sua ênfase do estudo das Escrituras e do pecado, e em sua atitude séria com relação à soberania de Deus, mas assume uma posição ambivalente em relação à his-toricidade da Bíblia, especialmente do Antigo Testamento. Embora apoie a maior parte dos ensinamentos bíblicos, ela não necessariamente aceita que todos os acontecimentos relatados na Bíblia ocorreram no tempo e no espaço. Seus críticos disseram que a neo-ortodoxia conseguia “ser a melhor e ao mesmo tempo a pior”, pois afirma as doutrinas tradicionais e, também, apoia os céticos que duvidavam da natureza histórica do cristianismo.
Teólogos como Emil Brunner, Gustaf Aulen, Reinhold e Richard Nie-buhr, além de Friedrich Gogarten, compartilharam da maioria das crenças de Barth sobre a soberania de Deus e o pecado do homem. Eles enfatizaram que a fé significa mais do que dizer SIM a algumas proposições teológicas. Pelo fato de a neo-ortodoxia pressupor a necessidade de um “salto de fé”, com relação às verdades aparentemente difíceis ou contraditórias, ela também foi chamada teologia da crise.
Em um mundo que enfrentou duas enormes guerras, as idéias de Barth levaram uma igreja indecisa de volta aos temas do pecado e da soberania de Deus. Muitos cristãos consideram esses textos volumosos tanto estimulantes quanto frustrantes. Barth flertou com o universalismo, a idéia de que Deus no final salvará todas as pessoas, embora o teólogo nunca tivesse enfrentado a questão. Em sua teologia cristocêntrica, ele, com freqüência, via Cristo no Antigo Testamento em lugares improváveis. Ele não aceitava a infalibilidade ou a inerrância das Escrituras.
Barth, no entanto, encorajou o estudo bíblico sério, enfatizou a pregação dinâmica e levou o homem de volta à compreensão de sua necessidade do Deus todo-poderoso — o aspecto positivo de sua obra. Em uma época em que muitos haviam se voltado para o mundo em busca de esperança, ele pedia que todos olhassem para Cristo.