1662
Rembrandt pinta O retorno do filho pródigo
A irretocável arte de O retorno do filho pródigo foi criada por um homem que sabia o que era ser pródigo e que mostrou pela sua arte quão profundamente o mundo precisava de salvação. Rembrandt Harmenszoon van Rijn tornou-se o maior pintor protestante, uma pessoa na qual a fé e a arte estavam perfeitamente combinadas.
Ele nasceu em uma família reformada, profundamente piedosa. Embora seus pais quisessem que se tornasse um estudioso, era bastante evidente que ele tinha uma inclinação natural pela arte. Seguindo o costume daqueles dias, Rembrandt passou a seguir artistas famosos e a aprendeu a pintar histórias bíblicas e acontecimentos de histórias referentes à mitologia grega e romana.
Porém, a arte que desenvolveu como estilo pessoal era muito diferente. Outros protestantes confinavam suas pinturas religiosas a quadros que relatavam a Bíblia, e os artistas católicos retratavam os santos. Rembrandt, porém, fazia de cada uma de suas pinturas uma declaração de fé. Ao passo que os protestantes afirmavam que somente a Bíblia era a norma para a religiosidade do homem, Rembrandt mostrou que as Escrituras poderiam também ser o padrão para a arte religiosa.
Nos dias de Rembrandt, as pessoas retratadas nas pinturas bíblicas se pareciam com super-heróis, pouco distintas dos deuses e semideuses retratados nas pinturas mitológicas. Isso não acontecia com os quadros de Rembrandt. Ele mostrava a humanidade como ela realmente era: cheia de cicatrizes, pecaminosa e carecendo de redenção. Homens e mulheres reais povoam sua obra, desde sua esposa e filho até mesmo as pessoas das ruas. Rembrandt tomou como base para um tocante retrato de um rei de Israel um mendigo de aspecto deplorável, que ele vestira com um turbante. Um judeu idoso e simples se transformou em um retrato do apóstolo Paulo.
Rembrandt também usou a si mesmo como modelo. Na obra O levantar da cruz, que retrata a pecaminosidade do homem, o pintor é um personagem que ajuda a crucificar a Cristo. Embora tenha criado o retrato, o artista não pôde fugir da necessidade de salvação pessoal.
A técnica do claro-escuro — na qual um fundo escuro contrasta grandemente com a luz brilhante sobre os personagens — é marca registrada da obra de Rembrandt. A profundidade da escuridão física muitas vezes mostra com clareza a luz espiritual interior nos personagens que retratava.
Contudo, o objetivo principal de Rembrandt não era evangelizar. Vivia da venda de suas obras e fez tanto trabalhos espirituais quanto seculares. Entretanto, até mesmo aquelas peças que não tinham o objetivo de retratar uma cena religiosa carregavam dentro de si o sentido da perspectiva que o artista tinha sobre o mundo e sobre a humanidade. Ele via a beleza da criação de Deus na natureza, percebendo tanto a beleza quanto o pecado nas faces humanas diante dele.
A despeito da aparente firmeza de convicções cristãs de suas obras, Rembrandt não teve uma vida tão impecável. Ele se casou com Saskia, mulher jovem e rica que morreu em 1642. Seu testamento afirmava que, se Rembrandt se casasse novamente, todas as suas posses seriam entregues ao filho deles, Tito. Cercado de problemas financeiros, o artista certamente percebeu que não poderia abdicar do dinheiro dela. É por isso que ele manteve Hendrickje, sua empregada, como uma espécie de concubina.
Rembrandt presenteou diversas gerações com uma pintura protestante bastante singular do mundo de Deus. Calvino afirmou: “Somente devemos pintar o que os olhos são capazes de ver”. Os olhos de Rembrandt criaram retratos que comunicavam a verdade. O retorno do filho pródigo mostra a humanidade de Rembrandt, seu amor por detalhes e a aguçada percepção do coração humano. O pai perdoador, o filho penitente e o irmão mais velho, vestidos em roupas do século XVII, encaixam-se perfeitamente na parábola de Jesus. Ele nos faz lembrar a infinitude e a atemporalidade das Escrituras.