À primeira vista parece que o ministério instrutor de Jesus não se arraigava
em nenhum princípio particular. Parecia mais uma espécie de atividade
espontânea, sem qualquer subjacente filosofia definida. Contudo, não é este o
caso. Estava muito longe de ser um processo acidental ou a esmo. Quanto mais
estudamos a obra de Jesus, mais vemos que ela se baseava em princípios
substanciais. Com efeito, tais princípios não foram apresentados em muitas
palavras. Mas estão claros na obra de Jesus, e aparecem quando nos pomos a
examiná-la. Anotaremos aqui alguns desses princípios.
1. Jesus Olhava para Longe
É evidente que Jesus olhou para longe ao escolher seus auxiliares. Olhando
lá da altitude divina, pôde ver neles aquilo que eles e seus companheiros nãq_
podiam enxergar. Olhava suas possibilidades futuras, e não meramente suas
presentes qualificações. Por exemplo, viu naquele Simão impulsivo, radicalista e
vacilante um caráter forte, corajoso e vigoroso, e por isso lhe deu o nome de
Pedro (pedra). Semelhantemente, viu naquele João muito jovem e descaridoso
(“filho do trovão”) um caráter bem mais amoroso e compreensivo, e mesmo “o
discípulo amado”. Jesus podia descobrir num fariseu cheio de orgulho ou numa
mulher de má vida possibilidades que ninguém enxergava. Afirma Bruce Barton:
“O povo via Zaqueu apenas um judeuzinho desonesto: Jesus viu nele uni homem
de generosidade incomum… Assim se deu também com Mateus: todos viam nele
nada mais que um desprezível coletor de impostos, mas Jesus viu nele o
potencial escritor dum livro que viveria para sempre.”
Assim como o pintor vê seu futuro quadro na tela ainda em branco, assim
como o escultor enxerga já a futura estátua no mármore bruto, o Mestre via em
cada discípulo a personalidade útil e extraordinária que seria no porvir, e por isso
trabalhava com otimismo e paciência na realização do seu plano. “Parece que
Jesus nunca perdeu a esperança no lidar com os homens. Sempre ele esperava
qualquer coisa dos piores e dos mais fracos deles.”
Jesus também olhou para longe, quando se lançou à obra de criar
caracteres fortes, sabendo que de fato é preciso bastante para firmar ideais
para consolidar e para desenvolver hábitos nobilitantes. Disse Maltbie D.
Baboock: “Bons hábitos não se formam no dia em que nascemos, e nem se cria o caráter cristão no dia do Ano Bom. A visão pode revelar-se, o sonho pode
alertar e o coração com nova inspiração pode galgar o topo da montanha; mas
a prova e o triunfo estão no sopé do monte, ao nível da planície./ O cogumelo
cresce numa noite, mas o carvalho precisa de uma década para desenvolverse.
Este fato aparece claro na parábola da semente lançada à terra, a qual
brota, e se desenvolve da erva até o grão grado na espiga (Mar. 4:28).
Também está claro na exortação a Pedro, de alimentar seus cordeirinhos e
fazer deles ovelhas (João 21:15-17).
Jesus sabia que o Reino de Deus não viria por meio de campanhas
turbilhonantes e nem por ocasiões grandemente trabalhadas, mas pelo processo
seguro de ensino e treinamento “preceito após preceito — regra após regra”.
Somente assim cristãos imaturos atingiriam a estatura completa do homem
cristão. Este olhar para longe deu a Cristo firmeza e constância. “Assim, quando
se via bloqueado numa direção, Jesus paciente e serenamente se voltava para
outra. Quando, cercado por todos os lados, não lhe restou outra coisa senão
morrer, Jesus o fez doce e confiantemente, como quando alimentava as
multidões junto ao mar”;
Jesus sempre estava certo dos resultados.
O olhar para longe, no que respeita às possibilidades de nossos alunos e à
tarefa de criar neles o caráter cristão por certo muito nos ajudará a conjurar todo
e qualquer pessimismo. Não faremos nunca como fez o pai de Woodrow Wilson,
que disse: “Receio que meu filho Woodrow não chegue a ser grande coisa.” Nem
agiremos como aquele evangelista que, ao término do reavivamento cm que se
converteram George Truett e outros mais, sentia que a reunião havia falhado em
muito, porque poucos adultos tinham sido ganhos para Cristo. Nem agiremos
como aqueles líderes eclesiásticos que hesitaram em admitir Dwight L. Moody
como membro de sua igreja.
Ao contrário, enxergaremos as infinitas possibilidades de cada aluno. De
modo semelhante, encararemos nosso ensino não como uma obra pesada e
incómoda, e. sim, como uma gloriosa oportunidade — o meio humano mais
eficiente para se criar e desenvolver o caráter cristão. Veremos, então, com von
Humboldt, que aquilo que desejamos ter cm a nossa civilização de amanhã deve
hoje ser em nossas escolas, e, com Roberto Wells Veach, que o progresso social
é uma cruzada de mestres-escolas. Veremos daí, que “o professor é, na
realidade, o guardião dos portais do amanhã”.
2 . Jesus Deu Valor ao Contato Pessoal
A tendência hodierna é buscar colher resultados por meio de atividades
levadas a cabo em grandes reuniões de gente. Vivemos obsedados pelos
números, pela quantidade. O sucesso dum evangelista, dum pastor ou dum
professor de educação religiosa é medido hoje pelo número de conversos, de membros de igreja, ou pelo tamanho da escola. Campanhas desta ou daquela
espécie são hoje a ordem do dia. Como Gregório, o iluminador, ou como
Francisco Xavier e outros mais ambiciosos missionários, queremos ganhar o
povo aos magotes. Assim, se enfatiza mais a multidão do que o indivíduo.
Isto não vai bem com o justo procedimento em matéria de educação
religiosa e trará quase sempre resultados superficiais e temporários. Através dos
anos, tem sido essa a causa de bom número de experiências espúrias e
deserções. Maior número de pessoas convertidas em cultos regulares
permanecem firmes, ao passo que, daqueles ganhos em reuniões de reavivamento,
bem poucos prosseguem na carreira. Tal ênfase explica em parte a
diferença existente entre o número de membros no rol da igreja e o número de
membros fiéis e ativos. Isso contribui também para dúvidas e deserções da fé. J.
R. Graves certa vez disse que muitos ateus notáveis, com os quais conversou,
haviam nalgum tempo feito sua profissão de fé.
Jesus enfatizava outra coisa: o contato pessoal. “Em grande parte., Jetus
empregou seu tempo a conversar com indivíduos, ou com aquele seu grupo de
discípulos ou alunos.” É verdade também que lidou com multidões. Tanto que
verdadeiras multidões o seguiam de Cafarnaum, de Jerusalém, de Decápolis e
doutros mais lugares. Chegavam, às vezes, a quatro ou cinco mil. Jesus
simpatizava com as multidões, dirigia-lhes a palavra, alimentava-as e as curava.
Certas vezes sua atividade chegou mesmo a tomar o aspecto dum grande movimento
popular, notadamente após certos períodos de curas e por ocasião de
sua entrada triunfal em Jerusalém.
Mas Jesus não estimulou o movimento das massas populares. Ao contrário,
parece até que tais movimentos o perturbavam, pois ele, nessas ocasiões,
desaparecia e fugia da multidão e buscava provocar a reação de pequenos
grupos. Quando grandes multidões o seguiam, Jesus lhes dizia que deviam amar
a ele mais que a qualquer parente mais próximo, para que se tornassem seus
leais seguidores (Luc. 14:25-27). Jesus conhecia bem a inconstância e
volubilidade das multidões, e o quanto era superficial a resposta de grupos,
sentindo perfeitamente que “aqueles que hoje nos abençoam e louvam podem
amanhã nos amaldiçoar e injuriar”, Assim, não se dedicou a trabalhar com as
massas populares. “O Mestre interessava-se mais por que poucos o
entendessem bem e se enchessem de seu Espírito do que por grandes multidões
que o seguissem de modo superficial.”
de seu tempo na lida com indivíduos. Os fatos mais
brilhantes do seu ministério se deram através dessas atividades junto a
indivíduos. “O método empregado por Jesus para a redenção deste mundo não
foi o de esperar grandes oportunidades ou momentos dramáticos, não. Foi o de utilizar qualquer oportunidade que se lhe apresentasse, no mais ordinária lugarcomum,
aproveitando-se dos acontecimentos corriqueiros” da vida de cada dia, e
daí tirava o que de mais proveitoso houvesse para qualquer alma necessitada.”
Dentre as pessoas com quem lidou pessoalmente, encontramos Nicodemos,
Zaqueu, a mulher de Samaria, a mulher apanhada em adultério, o homem que
queria receber sua parte da herança, o jovem rico, o crítico rabino, e o fidalgo de
Cafarnaum. Horne nos dá uma lista, ao todo, de perto de sessenta pessoas. Ao
lidar com elas, Jesus teve oportunidade de compreender suas necessidades e
aconselhá-las. O deão Inge comparou o líder de massas populares ao homem
que derrama um balde de água sobre um grupo de vasos de boca estreita,
esperando que alguns deles se encham. O conselheiro pessoal trata de casos
específicos. Jesus compreendeu a superioridade deste segundo método. Como
diz H. H. Horne: “Jesus, de preferência e com muito maior êxito, trabalhou com
indivíduos, levando em conta a própria natureza das multidões. Ele não confiava
nas multidões, nem a elas se confiou, mais confiava nos indivíduos.”
O mestre de nossos dias precisa ser um conselheiro pessoal, guiando o povo
à solução de seus problemas. Ao ensinar, deve ter uma classe de tamanho tal
que possa conhecer as necessidades individuais de cada aluno e ensinar, assim,
com eficiência. Deve o professor ter um registro especial de cada aluno, com
informes detalhados sobre os pais deles, seus amigos, seus professores na
escola pública, e, assim, preparar e apresentar cada lição à luz desses informes c
fatos. Disse um grande pregador: “George Truett revelou-se notável, quando
pregava do púlpito; mais notável ainda quando dos degraus do Capitólio em
Washington falava à Convenção Batista do Sul; fez-se maior ainda quando em
Atlanta falou à Aliança Batista Mundial. Revelou-se, no entanto, ainda mil vezes
maior quando, num pequeno cemitério de humilde cidade interiorana, falou para
confortar uma menina que perdera sua estremecida mãe.”
3 . Jesus Começava Onde Estava o Povo
Jesus não pregou sermões antecedentemente preparados para certas
ocasiões. Estivesse em casa, na sinagoga, na montanha ou à beira-mar,
ensinava sempre mui naturalmente e de modo informal, partindo do interesse do
aluno e de suas necessidades. “Ele começava não com crenças estereotipadas,
com assuntos previamente estipulados, com tradições ou mesmo com a Bíblia,
mas com pessoas vivas que com ele conviviam e que faziam parte de sua
experiência diária.” “Ele não tomava uma passagem da lei ou dos profetas, para
dela tirar princípios gerais, e imediatamente aplicá-los a qualquer necessidade
que viesse a descobrir. Ao contrário, ele tratava de situações humanas que tinha
diante de seus olhos.” Apanhava as pessoas como se lhe,apresentavam e buscava levá-las para onde queria que fossem. Isto calha perfeitamente com a
“Lei da Prontidão”, de Thorndike, que afirma, quando uma pessoa está pronta
para agir de certa maneira, ou em certo sentido, o fazer isso é coisa que a
satisfaz e a livra de aborrecimento.
Quando um doutor da lei lhe perguntou o que devia fazer para herdar a vida
eterna, Jesus lhe citou a lei dele (Luc. 10:25,26). Na conversa com a mulher
decaída, junto ao poço de Jacó, Jesus começou a falar em “água” — coisa em
que ela estava interessada, e a levou às “águas vivas” (João 4:10). Levantandose
na sinagoga para ler e proclamar o programa do seu ministério, Jesus
começou com aquela passagem familiar de Isaías que trata da expectativa
messiânica (Luc. 4:16-30). Assim, por este processo, Jesus atraía a atenção e o
interesse dos ouvintes. “No propósito de levar seus discípulos a aprender alguma
coisa, ele não se cingiu a programas formais, nem a currículos forjados de
antemão.”
Partir de onde se acha o discípulo significa não só começar pelos seus
interesses e necessidades, mas também linguagem que lhe seja familiar. Isto se
baseia na antiga lei da “apercepção”, que já em certo tempo recebeu grande
ênfase e que ‘ ainda precisa ser enfatizada. Literalmente, significa “adpercepção”,
ou adicionar algo à percepção do alune. A ideia aqui é esta: o aluno
aprende novas verdades mediante as velhas, ou chega ao desconhecido pelo
conhecido. “Verdades a serem ensinadas devem ser apresentadas mediante
verdades já conhecidas.” Aliás, é este, no aprendizado, o processo em voga.
Uma criança, tendo visto o quadro de um crocodilo, deu esse nome ao
primeiro lagarto que encontrou. Uma lavadeira de cor, assistindo a um desfile de
enfermeiras da Cruz Vermelha, exclamou que nunca vira tanta roupa caiada!
Uma criança do Sul, ao ver cair os primeiros flocos de neve, deu-lhes o nome de
plumagens. Visto que aprendemos novas verdades através das velhas, é de
suma importância escolher vocábulos e expressões que sejam familiares ao
aluno. Do contrário, não se formará a idéia exata. Jesus lançou mão de palavras
comuns como luz, sal, pão, carne, e se referia sempre a coisas mui conhecidas,
como solo, vinha, cordeiro, fermento.
De passagem, convém anotar que os tempos de maior incompreensão no
ministério de Jesus foram aqueles em que ele empregou uma terminologia que
tinha outro significado para seus ouvintes. Quando empregou o termo “novo
nascimento”, Nicodemos, embora homem culto, imediatamente pensou em
nascimento natural, físico. Quando falou do “Reino”, seus seguidores imaginaram
logo um reino terreno como o de Davi, um reino de força, e não um
reino espiritual nos corações humanos. Quando falou que, se seu “templo” fosse
destruído, em três dias o levantaria de novo, os discípulos não perceberam que
Jesus falava de seu corpo. Assim, pois, é preciso não só iniciai’ com experiências c problemas conhecidos do povo, mas também ver se os alunos
estão compreendendo claramente a linguagem e as ilustrações empregadas. O
Dr. Gambrell certa vez falou dum pregador que gastou três minutos para ilustrar
e dezoito para explicar o que desejava ensinar com a dita ilustração.
4. Jesus Detinha-se em Assuntos Vitais
Em todos os ensinos de Jesus não encontramos indicação alguma de que
ele se demorasse no tratamento de assuntos secundários ou incidentais. Ele não
ensinava os rudimentos do aprendizado, nem história, nem geografia, nem os
costumes da Palestina. Não dava tanta ênfase à organização, ao equipamento,
nem aos materiais que empregava no seu ensino. Também não enunciou
elaborados sistemas de doutrina a serem ministrados pelas gerações futuras. A
coisa que mais se aproxima disto é o Ensino do Monte, que pode ser lido em
meia hora. Também não acoroçoou que decorassem as Escrituras, comentários
delas, ou assuntos de discussão teológica como faziam os escribas em suas
classes nas sinagogas. Em vez disso o Mestre tratou de problemas vitais —
assuntos de modo definitivo pertinentes à conduta moral e religiosa.
O Mestre sabia muito bem que as saídas da vida procedem dos instintos
fundamentais, como o de conservação, de reprodução, de projeção e de
sociabilidade. Ele próprio houvera sido tentado em muitos desses pontos, e
sabia que a perversão desses impulsos produz os pecados da sociedade. O
problema da natureza humana é o principal. Assim, buscou Jesus controlar os
problemas da vida em sua própria fonte. Por isso, alertou seus seguidores contra
o espírito cúpido, que é a perversão e o resultado do instinto da conservação
própria. Pós de sobreaviso os homens contra o olhar lascivo, que provém do
instinto de reprodução, e disse a seus discípulos que fossem puros de coração.
Condenou o desenvolvimento do instinto de projeção, que arrasta o homem a
desejar os primeiros lugares e a dominar os outros. Também verberou
fortemente o orgulho e a vã exibição, perversões do instinto de sociabilidade. Assim
se detendo em assuntos vitais, repreendeu gentilmente os mestres de
Escola Bíblica Dominical que gastam tempo a tratar de assuntos secundários e
acidentais.
Discutindo temas vitais, Jesus não gastou seu tempo apenas para denunciar
os erros e os acontecimentos do dia, como o povo em geral o faz. Jamais tratou
negativamente dos problemas da vida, nem seu evangelho foi o de “recolhe-te à
tua insignificância”. Isto não perdurou, nem prevaleceu, como ele mostrou
perfeitamente na história do mau espírito que, uma vez expulso, voltou à casa
vazia e a habitou novamente (Mat. 12:43-45). Ao contrário, ele reconheceu a
necessidade de tratar os problemas de modo positivo. Noutras palavras, deve
haver uma nova dinâmica — “o poder expulsivo duma nova disposição de ânimo”. Por isso, Jesus buscou mostrar ao herdeiro cúpido que a vida é mais do
que nossas posses e bens, e à sórdida mulher samaritana que existem
satisfações e prazeres superiores aos materiais e físicos. Ele fez da religião uma
realidade vital e dinâmica. “Para Jesus, a vida é algo mais que o ajustamento ou
a adaptação dum organismo à sua ambiência imediata. Jesus tinha em mente a
personalidade forte e una que pode suportar qualquer teste.” “Jesus achava que
a religião é uma espécie de vida difusa nos interesses e atividades da pessoa… e
nunca um interesse específico, separado do restante da vida. Ele só falava em
termos de reações divino-humanas.”
5. Jesus Trabalhava a Consciência dos Indivíduos
Os escribas e os fariseus, os mentores profissionais da religião dos dias de
Jesus, intentavam desenvolver o caráter por meio de regulamentos e preceitos
assaz minuciosos. “Cristo apareceu no meio dum povo para quem a religião
consistií na aceitação dum elaborado código de regras, de épocas fixas e de
maneiras de cultuar.” Tais regras ocupavam minuciosamente quase todos os
setores da vida e sobrecarregavam por demais o povo. Havia, por exemplo,
quarenta e duas regras sobre o insignificante assunto, como era permitido dar um
nó no dia de sábado! A vida moral e religiosa era quase intolerável sob tal
sistema. Jesus bem conhecia a futilidade daquelas práticas exteriores e por isso
buscou libertar o povo duma virtual escravidão a elas. Foi também por isso que
ele clamou contra aquele estado de coisas, dizendo: “Carregais os homens com
fardos difíceis de suportar, e vós mesmos nem ainda com um dos vossos dedos
tocais nesses fardos” (Luc. 11:46). Fazia-se necessário, portanto, enfatizar
positiva e dinamicamente o lado espiritual da religião, para que o povo se
sentisse suficientemente preparado para enfrentar e solucionar os problemas da
vida. E isso Jesus buscou fazer, no afã de ajudar seus discípulos.
Como já anotamos, o Mestre percebeu a impropriedade das reações e
respostas que eram dominantemente emotivas, porém destituídas de convicções
bastantes que elevassem a moral do povo. Jesus via perfeitamente que histórias
patéticas e apelos ao orgulho não eram motivou defensáveis e próprios. Assim,
não lançou mão deles. Nunca ele pediu a qualquer pessoa que erguesse a mão,
que assinasse um voto ou que se pusesse de pé para testemunhar que o havia
aceito. Nem solicitou que alguém lhe apertasse a mão, embora exortasse todos a
que o seguissem. “Ele nunca compeliu alguém, nem impôs sua vontade; nunca
forçou alguém a concordar com ele, nem impôs dogmaticamente seu ensino.” As
decisões da vida são bastante sérias para que as não tomemos levianamente.
Ele desejava obter respostas que fossem permanentes, decisões que fossem
devidamente motivadas. Para Jesus não havia atalhos. Achava melhor não
receber resposta alguma do que obter reações espúrias industrializadas e
apressadas.
Por isso Jesus sempre apelava à consciência, que nada mais é que esse
sentimento de obrigação moral de cada um, ou a sensibilidade para com o bem e
o mal. “Estas coisas, porém, devíeis fazer”, disse Jesus aos escribas e fariseus
hipócritas (Mat. 23:23); e, repreendendo o homem que escondera seu talento,
disse: “Devias…” (Mat. 25 :27). Jesus sempre trabalhou mais a consciência dos
homens do que o intelecto. Ele promoveu a sua causa não só mediante o ensino
de verdades, mas a descansou sempre em consciências esclarecidas. E os
resultados justificaram esse bom princípio. Ele primou para que a verdade fosse
bem clara, mas também imperativa e constrangedora O povo, ao terminar ele seu
ensino, saía da presença do Mestre sentindo que algo deveria ser feito sobre o
que tinham ouvido. Horne diz: “Jesus, sem enunciar qualquer programa social,
influiu mais na reforma da sociedade do que aqueles que proclamaram extensas
plataformas de melhoramento social, porque criou essa consciência social que
transforma a sociedade.” E Hinsdale adiciona: “A segura e calma confiança que
Jesus tinha nos processos morais é o maior tributo que já se prestou à natureza
humana.” E também foi o maior tributo ao seu ensino.
Temos, pois, aqui um princípio que urge salientarmos cada vez mais, se
quisermos tornar nosso ensino eficaz e duradouro. Ele é verdadeiro, quer
busquemos conversões ou compromissos financeiros voluntários para a
obra religiosa. Ele conserva a liberdade e nos livra do superficialismo. É
infinitamente melhor que regulamentos minuciosos. O Dr. Gambrell certa vez
disse a seus colegas mais jovens, numa reunião na Faculdade: “Mui logo vocês
aprenderão que nada se consegue por meio de regras e regulamentos.” E
estava certo. Também nada conseguimos com meros apelos emotivos. Os
constantes e inúmeros desvios, quedas e deserções, e faltas de cumprimento de
votos provam esta verdade. A “consciência deve ser iluminada e despertada.
Nunca devemos fazer pressão sobre o povo, buscando levá-lo a fazer aquilo que
não quer fazer; ao contrário, devemos começar pelas suas necessidades. As
respostas devem nascer do sentimento de obrigação moral.
6. Jesus Olhara Sempre para o Que Havia de Bom no Individuo
Há pessoas que só olham para aquilo que de mau existe em seus
semelhantes. Assim, tomam uma atitude e tratam de coisas desagradáveis que
só podem colher respostas desfavoráveis. Levantam, desse modo, forte barreira
e resistência entre eles e a pessoa com quem estão lidando, Àmiúde se criam
mesmo antagonismos e inimizades. Assim agem não poucas vezes pessoas
bem intencionadas que sinceramente buscam acertar e ajudar; mas é claro que
lhes falta discernimento e também tato. Um colega de ginásio, a quem este
escritor levou a Cristo, disse depois de sua conversão: “Eu teria dado este passo
há muito se certas pessoas não me tivessem criticado tanto.” Esta tendência de olhar só para os defeitos de nossos semelhantes pode bem prejudicar a
matrícula da classe que ensinamos, pode dificultar nosso ensino e mesmo
inutilizar qualquer esforço que fazemos para levar nossos alunos a servir a
Cristo, embaraçando bastante o ganharmos nossos semelhantes para Jesus.
Pode surgir ela do fato de não termos compreendido bem este ou aquele aluno,
como pode ser o resultado duma atitude fria e antipática, e mesmo de falta de
tato e simpatia de nossa parte. Pode igualmente ser o resultado do cáustico espírito
de crítica. Seja como for, o fato é que essa tendência afasta ainda mais de
nós o discípulo nosso e produz mais mal do que bem.
Com Jesus tudo era diferente. De qualquer modo ele sempre enxergava algo
de bom e apreciável nos homens. Mesmo lidando com um fariseu empavonado e
cheio de justiça própria, com um coletor ladino e sem escrúpulos, ou com uma
decaída, Jesus sempre apelava para aquilo que de bom ainda houvesse no
íntimo deles, e trazia à tona alguma de suas boas qualidades. E assim tratava
Jesus não só aqueles que viviam chafurdados no pecado, mas também os que
apenas se mostravam imaturos e inexperientes. Parece-nos mesmo que o
Mestre se especializou em apanhar aqui e ali pessoas indesejáveis e
desprezíveis para fazer delas caracteres esplêndidos e extraordinários, como fez
com os onze.
E isso tudo Jesus conseguiu salientando as futuras possibilidades deles,
interessando-se por eles e inspirando-os a prosseguir no bem. “Ele cria que o
meio de se criar nos homens fé e confiança é mostrar que temos fé neles; e
Jesus nunca se afastou deste grande princípio de tratamento eficiente.” Quando
mostrou o que pode conseguir a fé do tamanho duma semente de mostarda;
quando disse à adúltera que também não a condenaria, e que fosse, e não mais
pecasse; e quando disse a seus discípulos que eles eram o sal da terra, o Mestre
Jesus estava implantando neles a confiança e a esperança que os arrastariam a
desdobrar seus esforços no sentido de não falharem à confiança que Jesus neles
depositava.
Uma das coisas mais importantes que podemos fazer como professores de
Escola Bíblica Dominical é procurar obter o máximo de nossos alunos. Não
existe aluno algum que praticamente seja um caso perdido, sem esperança,
pois sempre podemos descobrir nele brilhantes possibilidades. Não há nenhum
tão medíocre que não tenha em si alguma qualidade para a qual possamos
apelar. Quando alguém perguntou a uma propagandista de voto feminino na
Câmara de Boston quem a defenderia duma multidão hostil e ameaçadora, ela
apontou para o cabeça do motim, e disse: “Aquele cavalheiro me protegerá, e
verão como ele me dará a oportunidade de ser ouvida.” E aquele a quem ela
chamara de “cavalheiro” de fato fez justamente isso, dando-lhe a palavra.
Quando o superintendente da Escola Reformista de Rhode Island soube que
um rapaz interno estava planejando fugir para casa, forneceu-lhe a passagem
para ir fazer um wek-end com a mãe dele, e lhe disse que esperava que ele
voltasse ao internato mesmo quando a mãe e ele dissessem que não o fariam. E
o rapaz voltou. A Sra. Jessie Burral Eubank conseguiu em Washington no tempo
da guerra uma classe de 1.600 moças não-residentes, em grande parte só por
apelar para aquilo que elas podiam fazer de melhor, despertando-as com este
moto: “Nós queremos ser as especialistas das coisas impossíveis.” Cevemos,
sim, pôr nossa confiança, nosso otimismo e nossa inspiração contra a dúvida,
contra o desânimo, para cobrir as deficiências de nossos alunos e levá-los a
atingir o máximo em suas vidas. E só conseguiremos isso quando pudermos ver
algo das possibilidades latentes que dentro deles existem/
7. Jesus Assegurava a Liberdade de Ação do Aluno
Uma das famosas “Sete Leis do Ensino”, de João M. Gregory, é esta:
“Provoque e dirija as atividades próprias do aprendiz, e não lhe ensine aquilo
que ele pode aprender por si.” Esta lei se baseia no fato de que o aprendizado
não se efetua sem atividade mental. Tomás Carlyle dizia que “os santos não se
fazem durante o sono”. Também o erudito L. A. Weigle diz: “Não é aquilo que
você diz ou conta ao aluno, e, sim, aquilo que ele pensa depois de ouvir suas
palavras; não é aquilo que você faz por ele, e, sim, aquilo que ele faz com suas
próprias mãos; não é a impressão, e, sim, a reação dele que determina o seu
desenvolvimento. Você não pode enfiar idéias na cabeça do aluno; suas
palavras são apenas símbolos das idéias que estão em sua mente. O aluno
deve interpretar tais símbolos e daí com isso construir suas próprias idéias. O
ensino só obtém êxito quando leva o aluno a agir.”
O aluno não deve simplesmente assentar-se calado enquanto o professor
fala e ensina. A mente dele deve estar em atividade. Faz-se necessário um
movimento de três ciclos — conhecimento intelectual, estímulo emotivo e
resposta volitiva. O aluno só aprende a renunciar quando se nega a si mesmo; só
toma consciência da alegria de dar quando dá desinteressadamente e pelo
prazer de dar. Por isso é que contar histórias, prelecionar, apresentar auxílios
audiovisuais não basta. A discussão, a dramatização, as projeções podem ajudar
o ensino. Mas, só fazendo é que aprendemos a fazer.
Este princípio o Mestre conhecia perfeitamente e o empregou sempre,
“Longe de oferecer soluções conseguidas de pronto, Jesus dirigia o povo,
deixando que com seus próprios recursos obtivessem a resposta.”
Ele certamente estava salientando este princípio quando disse: “Se alguém
quiser fazer a vontade de Deus, há de saber” (João 7:17). Também frisou o
mesmo princípio quando comparou o simples ouvir ao construir uma casa sobre a areia, e o ouvir e o responder ao construir sobre a rocha. O ponto principal da
Parábola dos Talentos é aquele que nos chama a atenção para o homem que
usa e desenvolve seus poderes, concluindo-se que quem assim não faz acaba
perdendo-os. Na parábola sobre os solos, Jesus nos ensina que o que importa é
a resposta à sementeira.
Deixou que os discípulos batizassem por ele, e os enviou, bem como a
outros, em missões de ensino e cura. Jesus fez que os discípulos distribuíssem
dos pães e dos peixes, ao alimentar os cinco mil, e também lhes pediu que
tirassem a pedra posta à entrada do túmulo de Lázaro. O cego deveria lavar os
olhos no tanque de Siloé antes de receber a vista, e o moço rico vender tudo e
dar aos pobres para estar habilitado a possuir a vida eterna. Entre as atividades
mencionadas, encontramos estas: levantar, vir, seguir, ir, lavar, fazer, vigiar,
oferecer, pregar, ensinar, fazer discípulos, dar de comer. O Evangelho de Jesus
era de pensamento e ação, bem como de ouvir, sentir e praticar.
Sugestões auxiliares para o ensino do quarto capítulo
Esboço no Quadro-negro
1. Olhar para Longe
2. Dar Valor ao Contato Pessoal
3. Principiar Onde Está o Aluno
4. Deter-se em Assuntos Vitais
5. Trabalhar a Consciência do Aluno
6. Olhar para o Que Há de Bom no Aluno
7. Assegurar a Liberdade de Ação do Aluno
Tópicos Para Discussão
1. Mostre a importância de descobrir as possibilidades do aluno.
2. Por que Jesus preferia lidar mais com indivíduos do que com as multidões?
3. Discuta o princípio da apercepção.
4. Quais os temas mais vitais que devem ser tratados?
5. Dê sua definição de consciência.
6. Como assegurar a liberdade de ação do aluno?
Assuntos para Revisão e Exame
1. Mostre como Jesus descobria as possibilidades do aluno.
2. Por que o Mestre colocou os ideais acima dos regulamentos e preceitos?
3. Como ele assegurava a liberdade de ação do estudante?