Dois textos apócrifos constituem o Evangelho de Nicodemus: Atos de Pilatos e Descida de Cristo ao Inferno. Em é seqüência do outro e o completa, embora escritos em épocas diferentes. Justino, em 150, menciona em seus escritos um texto chamado Atos de Pôncio Pilatos, narrando os acontecimentos posteriores à Crucificação.
Nicodemus narra os episódios da Crucificação e da Ressurreição, mas nada acrescenta aos Evangelhos canônicos. Curioso é observar que ele cita o local da Crucificação como sendo o horto onde Cristo foi aprisionado, o Getsêmani, situado ao pé do Monte das Oliveiras.
EVANGELHO DE NICODEMUS
Eu, Ananias, protetor, de hierarquia pretoriana, perito em leis, vim através das divinas Escrituras tomar conhecimento de Nosso Senhor Jesus Cristo e me aproximei dele pela fé, e permiti-me receber o santo batismo; agora sinto-me, depois de seguir a pista das narrações relativas a Nosso Senhor Jesus Cristo, que foram feitas naquela época, e que os judeus deixaram guardadas com Pôncio Pilatos; encontrei-as com estavam, escritas em hebraico, e com o beneplácito divino traduzi-as para o grego, para o conhecimento de todos os que invocam o nome de Nosso Senhor Jesus Cristo, durante o reinado de Flávio Teodósio, nosso senhor, no ano 17, e sexto de Flávio Valentino, na nona indicação.
Todos, pois, quantos leiam e traduzam isto para outros livros, lembrem- se e peçam por mim para que o Senhor seja piedoso para comigo e me perdoe os pecados que cometi contra ele.
Paz aos leitores, aos ouvintes e aos seus servidores. Amém.
No ano décimo quinto do governo de Tibério César, imperador dos romanos; no ano décimo nono do governo de Herodes, rei da Galiléia; no oitavo dia das calendas de abril, correspondente ao dia 25 de março; durante o consulado de Rufo e Rubelião; no quarto ano da olimpíada 202; sendo, nessa época, José Caifás o sumo sacerdote dos judeus. Tudo o que Nicodemus narrou com base no tormento da cruz e da paixão do Senhor, transmitiu-o aos príncipes dos sacerdotes e aos demais judeus depois de havê-lo redigido ele mesmo em hebraico.
Depois de se haverem reunido em conselho os príncipes dos sacerdotes e os escribas, Anás e Caifás e Semes e Dothaim e Gamaliel, Judas, Levi e Neftali, Alexandre e Jairo e os restantes dentre os judeus apresentaram-se diante de Pilatos acusando Jesus de muitos feitos, dizendo: “Sabemos que ele é filho de José o carpinteiro e que nasceu de Maria, e chama-se a si mesmo Filho de Deus e rei; além disso profana o sábado e ainda pretende abolir a lei de nossos pais”. Disse-lhes Pilatos: “E o que ele faz e o que ele pretende abolir?” Os judeus disseram: “Temos uma lei que proíbe a cura no Sabat; pois bem, este, servindo-se das más artes, curou durante o Sabat coxos, machucados, cegos, paralíticos, surdos e endemoninhados”. Disse-lhes Pilatos: “Se realiza honestamente suas curas, não faz mal algum.” Os judeus replicaram: “Se realizasse suas curas honestamente, não seria mal maior; mas para fazê-las usa a virtude de Belzebu, príncipe dos demônios, expulsa a estes e a todos que lhes são submissos”. Disse-lhes Pilatos: “Isto não é tirar os demônios pela virtude de um espírito imundo, mas sim pela virtude do deus Esculápio”.
Os judeus disseram a Pilatos: “Rogamos à tua autoridade que ele seja apresentado diante do teu tribunal para que possa ser ouvido”. Pilatos então chamou-os e disse-lhes:
“Dizei-me vós como é que eu, um mero governador, posso submeter nada menos que um rei a interrogatório?” Eles responderam: “Nós não dissemos que é um rei, mas sim que ele mesmo se dá esse título”. Então Pilatos chamou o mensageiro para dizer-lhe: “Que me seja apresentado aqui Jesus, com toda a deferência”. O mensageiro saiu, então, e logo que identificou, o adorou; depois tirou o manto que levava em suas mãos e estendeu-o no chão, dizendo: “Senhor, passa por cima e entra, que o governador te chama”. Os judeus, vendo o que o mensageiro havia feito, puseram-se a gritar contra Pilatos, dizendo: “Por que te serviste de um mensageiro para fazê-lo entrar, e não de um simples pregoeiro? Sabes que o mensageiro, assim que o viu, passou a adorá-lo e estendeu seu manto sobre o chão, fazendo-o caminhar por cima como se fosse um rei?”
Pilatos, então, chamou o mensageiro e lhe disse: “Por que fizeste isso e estendeste o manto sobre o chão, fazendo Jesus passar por cima?” O mensageiro respondeu: “Senhor governador, quando me enviaste a Jerusalém junto com Alexandre eu o vi montando um burro, e os filhos dos hebreus iam aclamando-o com ramos nas mãos, enquanto outros estendiam suas vestes no chão dizendo: “Salva-nos, tu que estás nas alturas; bendito o que vem em nome do Senhor’.”
Os judeus então começaram a gritar e disseram ao mensageiro: “Os jovens hebreus clamavam em sua língua, como então informaste da sua equivalência em grego?” O mensageiro respondeu: “Perguntei a um dos judeus e lhe disse: “Que estão gritando em hebraico?’ E ele traduziu”. Pilatos disse-lhes: “Como soa em hebraico o que eles diziam em altos brados?” Os judeus responderam: “Hosanna membrome; baruchamma; adonai”. Então Pilatos lhes disse: “E o que significa Hosanna e as outras palavras?” Os judeus responderam: “Salva-nos, tu que estás nas alturas; bendito o que vem em nome do Senhor”. Pilatos disse-lhes: “Se vós mesmos dais testemunho das vozes que saíram da boca dos jovens, que falta cometeu o mensageiro?” Eles se calaram. Então o governador disse ao mensageiro: “Sai e faze-o entrar da maneira que lhe aprouver”. Saiu, então, o mensageiro e procedeu da mesma maneira que anteriormente, dizendo a Jesus: “Senhor, entra; o governador te chama”.
Mas no momento em que Jesus entrava, os que seguravam os estandartes inclinaram-se e adoraram a Jesus. Os judeus que presenciaram esse gesto de reverência e adoração a Jesus, começaram a gritar desaforos contra os que portavam as bandeiras. Mas Pilatos lhes disse: “Não vos causa admiração ver como eles se inclinaram e adoraram Jesus?” Os judeus responderam a Pilatos: “Nós mesmos vimos como eles se inclinaram e o adoraram”. O governador chamou então os que carregavam as bandeiras e lhes disse: “Por que agistes assim?” Eles responderam a Pilatos: “Nós somos gregos e servidores das divindades, como então iríamos adorá-lo? Saibas que, enquanto estávamos eretos, nossos corpos se inclinaram por eles mesmos e o adoraram”.
Então Pilatos disse aos arquissinagogos e anciãos do povo: “Escolhei vós mesmos alguns varões fortes e robustos; que eles segurem os estandartes e vejamos se estes inclinam-se sozinhos: “Então os anciãos escolheram de entre os judeus doze homens fortes e robustos, aos quais obrigaram a sustentar os estandartes em grupos de seis, e ficaram em pé diante do tribunal do governador. Então Pilatos disse ao mensageiro: “Leva-o para fora do pretório e introduze-o novamente da maneira que te aprouver”. E Jesus saiu do pretório acompanhado do mensageiro. Pilatos chamou então aqueles que anteriormente estavam com os estandartes e lhes disse: “Jurei pela saúde de César que, se os estandartes não se dobrarem à entrada de Jesus, cortar-vos-ei as cabeças”. E o governador ordenou novamente que Jesus entrasse. O mensageiro observou a mesma conduta do início e rogou
encarecidamente a Jesus que passasse por cima de seu manto. E caminhando sobre ele, entrou. Mas no momento de entrar, novamente os estandartes se dobraram e adoraram Jesus.
Quando Pilatos viu a cena, encheu-se de medo e dispôs-se a deixar o tribunal. Mas enquanto ainda pensava em levantar-se, sua mulher enviou-lhe esta carta: “Não te envolvas com esse justo, pois durante a noite sofri muito por sua causa”. Então Pilatos chamou todos os judeus e lhes disse: “Sabeis que minha mulher é piedosa e que tende mais para o bem do que para segui-los em vossos costumes judeus?” Eles disseram: “Sim, sabemos”. Pilatos disse-lhes: “Pois bem, minha mulher acaba de enviar-me este recado: “Não te envolvas com esse justo, pois durante a noite sofri muito por sua causa’.” Mas os judeus responderam a Pilatos dizendo: “Não te dissemos que é um mágico? Sem dúvida enviou um sono fantástico a tua mulher”.
Pilatos então chamou Jesus e lhe disse: “Como é que estes testemunham contra ti? Não dizes nada?” Jesus respondeu: “Se não tivessem pode para isso, não diriam nada, pois cada um é dono da sua boca para falar coisas boas e más: eles verão”.
Mas os anciãos dos judeus responderam, dizendo a Jesus: “Que é que nós vamos ver? Primeiro, que tu vieste ao mundo por fornicação; segundo, que o teu nascimento em Belém trouxe como conseqüência uma matança de crianças; terceiro, que teu pai José e tua mãe Maria fugiram para o Egito por encontrarem-se ameaçados na cidade”.
Então, alguns dos que ali estavam presentes, e que eram judeus piedosos, disseram: “Nós não estamos de acordo que haja de fornicação, mas sim sabemos que José desposou Maria e que não foi gerado através de fornicação”. Pilatos disse aos judeus que afirmavam a sua origem através de fornicação: “Isto que dizeis não é verdade, posto que os esponsais foram celebrados, segundo afirmam vossos próprios compatriotas”. Então Anás e Caifás disseram a Pilatos: “Todos juntos afirmamos e não cremos que ele tenha nascido de fornicação; estes são prosélitos e seus discípulos”. Pilatos chamou Anás e Caifás e disse- lhes: “Que significa a palavra prosélito?” Eles responderam: “Que nasceram de pais gregos e fizeram-se judeus agora”. Ao que contestaram os que afirmavam que Jesus não havia nascido de fornicação (isto é: Lázaro, Astério, Antônio, Tiago, Amnés, Zeras, Samuel, Isaac, Crispo, Agripa e Judas): “Nós não nascemos prosélitos, mas sim somos filhos de judeus e dizemos a verdade, pois encontravam-nos presentes nas bodas de José e de Maria”. Pilatos chamou estes doze que afirmavam não haver Jesus nascido de fornicação e disse-lhes: “Eu os conjuro pela saúde de César, dizei-me, é verdade o que afirmastes, que não nasceu de fornicação?” Eles responderam: “Nós temos uma lei que proíbe jurar, porque é pecado; deixe que estes jurem pela saúde de César que não é verdade o que acabamos de dizer, e seremos réus de morte”. Então Pilatos disse a Anás e Caifás: “Nada respondem a isto?” Eles replicaram: “Tu dás crédito a estes doze que afirmam o nascimento legítimo de Jesus; enquanto isso, todos, em massa, estamos bradando que é filho de fornicação, que é
feiticeiro e que se chama a si próprio Filho de Deus”.
Então Pilatos ordenou que toda a multidão saísse, à exceção dos doze que negavam a origem da fornicação, e ordenou que Jesus fosse separado. Depois lhes disse: “Por que razão querem dar-lhe a morte?” Eles responderam: “Têm inveja dele por curar no Sabat”. Ao que respondeu Pilatos: “E por uma boa obra querem matá-lo?”
E, cheio de ira, saiu do pretório e disse-lhes: “Tomo por testemunha o sol de que não encontro nenhuma culpa neste homem”. Os judeus responderam e disseram ao governador: “Se não fosse um malfeitor, não o haveríamos entregado a ti”. E Pilatos disse: “Tomai-o vós e julgai-o segundo vossas leis”. Então os judeus disseram a Pilatos: “Não nos é
permitido matar ninguém”. Ao que Pilatos contestou: “A vós sim Deus proibiu de matar mas, e a mim?”
E, entrando de novo no pretório, chamou Jesus à parte e disse-lhe: “És o rei dos judeus?” Jesus respondeu: “Dizes isto por conta própria ou pelo que os outros te disseram de mim?” Pilatos replicou: “Mas será que também sou por acaso judeus? Teu povo e os pontífices puseram-te em minhas mãos, que fizeste?” Jesus respondeu: “Meu reino não é deste mundo pois, caso contrário, meus servidores teriam lutado para que eu não fosse entregue aos judeus; mas o meu reino não é daqui”. Então Pilatos disse: “Logo, tu és rei?” Jesus respondeu: “Tu dizes que eu sou rei; pois para isto nasci e vim ao mundo, para que todo aquele que é da verdade, ouça minha voz”. Pilatos disse-lhe: “Que é a verdade?” Jesus respondeu: “A verdade provém do céu”. Pilatos disse: “Não há verdade sobre a terra?” E Jesus respondeu a Pilatos: “Estás vendo que os que dizem a verdade são julgados pelos que exercem o poder sobre a terra”.
E deixando Jesus no interior do pretório, Pilatos foi até os judeus e lhes disse: “Eu não encontro culpa alguma nele”. Os judeus replicaram: “Ele disse: “Eu sou capaz de destruir este templo e reedificá-lo em três dias’.” Pilatos disse: “Que templo?” Os judeus responderam: “Aquele edificado por Salomão em quarenta e seis anos, ele diz que vai destruí-lo e reedificá-lo ao final de três dias”. Pilatos disse: “Eu sou inocente do sangue deste justo; vós vereis”. E os judeus disseram: “Seu sangue sobre nós e sobre nossos filhos”.
Então Pilatos chamou os anciãos, os sacerdotes e os levitas e disse-lhes em segredo: “Não agi assim, pois nenhuma das vossas acusações merece a morte, já que elas referem-se às curas e à profanação do Sabat”. Os anciãos, sacerdotes e levitas responderam: “Se alguém blasfema contra César é ou não digno da morte?” Pilatos disse-lhes: “É digno da morte”. Os judeus disseram: “Pois se alguém que blasfema contra César é digno da morte, saiba que este blasfemou contra Deus”.
Depois o governador mandou que os judeus saíssem do pretório, e chamando Jesus, disse-lhe: “Que vou fazer contigo?” Jesus respondeu: “Faz como te foi ordenado”. Pilatos disse: “E como me foi ordenado?” Jesus respondeu: “Moisés e os profetas falaram sobre a minha morte e sobre a ressurreição”. Os judeus e os ouvintes perguntaram então a Pilatos dizendo: “Por que continuas ouvindo essa blasfêmia?” Pilatos respondeu: “Se estas palavras são blasfêmias, prendei-o por blasfêmia, levai-o à vossa sinagoga e julgai-o segundo vossa lei”. Os judeus contestaram: “Está escrito em nossa lei que se um homem peca contra outro homem merece receber quarenta açoites menos um; mas diz que se alguém blasfema contra Deus deve ser apedrejado”.
Pilatos disse-lhes: “Tomai-o por vossa conta e castigai-o como quiserdes”. Os judeus replicaram: “Nós queremos que seja crucificado”. Pilatos contestou: “Não merece a crucificação”.
Então o governador lançou um olhar ao seu redor sobre a turba de judeus que estava presente e, ao ver que muitos deles choravam, exclamou: “Nem toda a multidão quer que morra”. Os anciãos dos judeus disseram: “Por isso viemos todos em massa, para que morra”. Pilatos perguntou-lhes: “E por que deverá morrer?” Os judeus responderam: “Porque chamou-se a si próprio filho de Deus e rei”.
Um certo judeu de nome Nicodemus pôs-se diante do governador e disse: “Rogo-te, bondoso como és, permiti-me dizer umas palavras: “Pilatos respondeu: “Fala”. E Nicodemus disse: “Tenho falado nestes termos aos anciãos, aos levitas, à multidão inteira de Israel reunida na sinagoga: “Que pretendeis fazer com este homem? Ele opera muitos
milagres e prodígios como nenhum outro foi nem será capaz de fazer. Deixai-o em paz e não trameis nada contra ele; se os seus prodígios têm origem divina, permanecerão firmes; porém, se têm origem humana, dissipar-se-ão. Pois também Moisés, quando foi enviado da parte de Deus ao Egito, fez muitos prodígios, previamente assinalados por Deus, na presença do Faraó, rei do Egito. E estavam ali alguns homens a serviço do Faraó, Jamnes e Jambres, os quais operaram, por sua vez, não poucos prodígios como os de Moisés, e os habitantes do Egito tinham Jamnes e Jambres por deuses. Mas como os seus prodígios não provinham de Deus, eles pereceram, bem como os que lhes davam crédito. E agora, deixai livre este homem, pois não é digno de morrer’.”
Os judeus disseram então a Nicodemus: “Tu te fizeste discípulo dele e por isso falas em seu favor”. Nicodemus disse-lhes: “Mas então também o governador fez-se discípulo dele porque fala em sua defesa? Não o colocou César neste cargo? Os judeus estavam com muita raiva e rangiam os dentes contra Nicodemus. Pilatos disse-lhes: “Por que rangeis os dentes contra ele ao ouvir a verdade?” Os judeus disseram a Nicodemus: “A ti sua verdade e sua parte”. Nicodemus disse: “Amém, amém, que assim seja como haveis dito”.
Mas um dos judeus adiantou-se e pediu a palavra ao governador. Este lhe disse: “Se queres dizer algo, diz”. E o judeus assim falou: “Eu estive durante trinta e oito anos deitado numa liteira, cheio de dores. Quando Jesus veio, muitos dos que estavam endemoninhados e sujeitos a diversas doenças foram curados por ele. Então alguns jovens compadeceram-se de mim e, pegando-me com liteira e tudo, levaram-me até ele. Jesus, ao ver-me, compadeceu-se de mim e disse-me: “Pega tua maca e anda’. Eu peguei minha maca e comecei a andar”. Então os judeus disseram a Pilatos: “Pergunta-lhe que dia era quando foi curado”. E o interessado disse: “Era Sabat”. Os judeus disseram: “Já não te havíamos informado de que curava no Sabat e tirava demônios?”
Outro judeus adiantou-se e disse: “Eu era cego de nascença, ouvia vozes, mas não via ninguém, e, ao ver passar Jesus, gritei bem alto: “Filho de Davi, apiedai-te de mim’. E compadeceu-se de mim, impôs suas mãos sobre os meus olhos e imediatamente recuperei a visão”. E outro judeus adiantou-se e disse: “Estava arqueado e endireitou-me com uma palavra”. E outro disse: “Havia contraído lepra e ele curou-me com uma palavra”.
E certa mulher chamada Berenice (Verônica) começou a gritar de longe, dizendo: “Encontrando-me doente com hemorragia, toquei a extremidade de seu manto e a hemorragia que eu vinha tendo por doze anos consecutivos, parou”. Os judeus disseram: “Existe um preceito que proíbe apresentar uma mulher como testemunha”.
E alguns outros, muitos homens e mulheres gritavam, dizendo: “Este homem é profeta e os demônios submetem-se a ele”. Pilatos disse aos que afirmavam isto: “Por que também vossos mestres não se submeteram a ele?” Eles responderam: “Não sabemos”. Outros afirmaram que havia ressuscitado Lázaro do sepulcro, defunto já de quarenta dias. Então, cheio de medo, o governador disse à multidão de judeus: “Por que vos empenhais em derramar sangue inocente?”
E depois de chamar Nicodemus e aqueles doze homens que afirmavam a origem limpa de Jesus, disse-lhes: “Que devo fazer, pois está forjando um alvoroço entre o povo?” Disseram-lhe: “Nós não sabemos; eles verão”. Convocou de novo Pilatos a multidão de judeus e disse-lhes: “Sabeis que tenho por costume soltar um prisioneiro durante a festa dos ázimos. Pois bem, está preso e condenado um assassino chamado Barrabás, e tenho também este Jesus que está agora na vossa presença, e em quem não encontro culpa alguma. A quem quereis que solte?” Eles gritaram: “A Barrabás”. Pilatos disse-lhes: “Que farei, pois, de Jesus, o chamado Cristo?” Os judeus responderam: “Que seja crucificado!”
E alguns dentre eles disseram: “Não és amigo de César se soltas a este, porque chamou-se a si próprio Filho de Deus e rei; se assim procedes, queres a este por rei e não a César”.
Pilatos então, encolerizado, disse aos judeus: “Vossa raça é revoltada por natureza e enfrentais vossos benfeitores”. Os judeus disseram: “A quais benfeitores?” Pilatos respondeu: “Vosso Deus tirou-vos do Egito, livrando-vos de uma cruel escravidão; vos manteve sãos e salvos através do mar bem como através da terra, alimentou-vos com maná no deserto e deu-vos codornas, deu-vos de beber água tirada de uma rocha e deu-vos uma lei, e, depois de tudo isso, encolerizastes vosso Deus, fostes atrás de um bezerro fundido, exasperastes vosso Deus e Ele dispôs-se a exterminar-vos; porém, Moisés intercedeu por vós e não fostes entregues à morte. E agora acusais a mim de odiar o imperador”.
E, levantando-se do tribunal, dispôs-se a sair. Mas os judeus começaram a gritar dizendo: “Nós reconhecemos como rei a César e não a Jesus. E ainda mais, os Magos vieram oferecer-lhe dons trazidos do Oriente como para o seu rei; e quando Herodes tomou conhecimento através dessas personagens de que um rei havia nascido, tentou acabar com ele. Mas seu pai José tomou ciência do fato e levou-o juntamente com a mãe, e fugiram todos para o Egito. E quando Herodes soube disso, exterminou os filhos dos hebreus que haviam nascido em Belém”.
Quando Pilatos ouviu estas palavras, temeu, e depois de impor silêncio às turbas, já que estavam gritando, disse-lhes: “Então é este aquele a quem Herodes buscava?” Os judeus responderam: “Sim, é este”. Então Pilatos pegou água e lavou suas mãos, de frente para o sol, dizendo: “Sou inocente do sangue deste justo; vós vereis”. E novamente os judeus começaram a gritar: “Seus sangue sobre nós e sobre nossos filhos”. Então Pilatos mandou que fosse corrido o véu do tribunal onde estava sentado e disse a Jesus: “Teu povo desmentiu-te como rei. Por isso decretei que em primeiro lugar sejas flagelado, de acordo com o antigo costume dos reis piedosos, e que depois sejas dependurado na crus no horto onde foste aprisionado. E Dimas e Gestas, ambos malfeitores, serão crucificados juntamente contigo”.
Assim, Jesus saiu do pretório acompanhado dos dois malfeitores. E, em chegando ao lugar convencionado, despojaram-no de suas vestes, enrolaram-no em um lençol e puseram uma coroa de espinhos ao redor de suas têmporas. Dependuraram os dois malfeitores, de maneira semelhante. Enquanto isso, Jesus dizia: “Pai, perdoai-os, porque não sabem o que fazem”. E os soldados repartiram entre si as suas vestes, e todo o povo estava em pé contemplando-o. E os pontífices e também os chefes zombaram dele, dizendo: “Salvou os outros; salve-se, então, a si próprio; se este é o Filho de Deus, que desça da cruz”. Os soldados, por sua vez, aproximavam-se dirigindo-lhe escárnios e oferecendo-lhe vinagre misturado com fel, enquanto diziam: “Tu és o rei dos judeus: salva-te a ti mesmo”. E depois de proferir a sentença, o governador mandou que na forma de um título fosse escrito em cima da cruz a sua acusação em grego, latim e hebraico, de acordo com o que os judeus haviam dito: “Rei dos Judeus”.
E um daqueles ladrões que haviam sido dependurado disse-lhe assim: “Se tu és o Cristo, salva-te a ti mesmo e a nós”. Mas Dimas, em resposta, repreendeu-o dizendo: “Tu não temes a Deus, ainda que estejas na mesma condenação? E a nós, certamente, ela no cabe bem, pois recebemos a recompensa justa pelas nossas obras; mas este não fez nada de mal”. E dizia: “Senhor, lembra-te de mim no teu reino”. E Jesus disse-lhe: “Em verdade, em verdade te dito que hoje estarás comigo no paraíso”.
Era a hora sexta quando as trevas se fecharam sobre a terra até a nona hora, por haver escurecido o sol; e o véu do templo rasgou-se ao meio. Jesus, então, com voz grave, disse:
“Pai, baddach efkid ruel”, que significa: “Em tuas mãos entrego o meu espírito”. E, assim dizendo, entregou sua alma. O centurião, ao ver o que aconteceu, louvou a Deus dizendo: “Este homem era justo”. E a multidão que assistia ao espetáculo, ao contemplar o acontecido, passou a bater no peito.
O centurião, por sua vez, transmitiu ao governador o ocorrido. Este, ao ouvi-lo, entristeceu-se assim como sua mulher, e ambos passaram todo aquele dia sem comer nem beber. Depois Pilatos fez chamar os judeus e disse-lhes: “Vistes o que se passou?” Mas eles responderam: “Foi um simples eclipse do sol, como de costume”.
Enquanto isso, seus conhecidos permaneciam a distância; e as mulheres que o haviam acompanhado desde a Galiléia estavam contemplando tudo isto. Mas havia um homem chamado José, senador, vindo de Arimatéia, que esperava o reino de Deus. Aproximou-se, então, de Pilatos e pediu-lhe o corpo de Jesus. Depois foi baixar o cadáver da cruz e envolveu-o num lençol limpo e depositou-o no sepulcro talhado em pedra que ainda não havia sido usado.
Quando os judeus ouviram dizer que José havia reclamado o corpo de Jesus, começaram a procurá-lo, assim como também aqueles que haviam declarado que Jesus não havia nascido de fornicação. Nicodemus e muitos outros que se haviam apresentado diante de Pilatos para dar testemunho das suas boas obras. E, como todos se houvessem escondido, somente Nicodemus apareceu, porque era varão principal entre os judeus. Assim, Nicodemus disse-lhes: “Como haveis entrado na sinagoga?” Os judeus responderam: “E tu? Como entraste na sinagoga? Posto que és seu cúmplice, seja também sua parte contida no século vindouro”. E Nicodemus disse: “Assim seja, assim seja”. José, por sua vez, apresentou-se de maneira semelhante e disse-lhes: “Por que haveis ficado apreensivos comigo por ter reclamado o corpo de Jesus? Pois sabei que depositei-o no meu novo sepulcro, depois de havê-lo envolvido num lençol branco, e fiz correr a pedra sobre a entrada da gruta. Mas não vos portastes bem com aquele justo, pois que, não contentes em crucificá-lo, também o atravessastes com uma lança”. Os judeus então detiveram José e mandaram que fosse aprisionado até o primeiro dia da semana. Depois disseram-lhe: “Bem sabes que o avançado da hora não nos permite fazer nada contra ti, pois o sábado já está amanhecendo; mas saiba que nem sequer far-se-á o favor de dar-te sepultura, mas sim exporemos teu corpo às aves do céu”. José retrucou: “Esta maneira de falar é a do soberbo Golias que injuriou o Deus vivo e o santo Davi. Pois o Senhor disse através do profeta: “A mim corresponde a vingança e eu retribuirei’. E ainda há pouco, aquele que não é circuncidado segundo a carne, mas é circunciso de coração, tomou água, lavou as mãos de frente para o sol e disse: “Sou inocente do sangue deste justo; vós havereis de ver’. Mas vós respondestes a Pilatos: “Seu sangue sobre nós e sobre nossos filhos’. Agora, então, temo que a ira do Senhor recaia sobre vós e sobre vossos filhos, como dissestes”. Ao ouvir essas palavras os judeus sentiram seus corações encherem-se de raiva, e, depois de capturar José, detiveram-no e prenderam-no em uma casa onde não havia nenhuma janela; depois selaram a porta onde José estava preso e alguns guardas permaneceram junto dela.
E no sábado os arquissinagogos, os sacerdotes e os levitas estabeleceram que no dia seguinte todos deveriam encontrar-se na sinagoga. E bem de madrugada a multidão inteira pôs-se a deliberar que tipo de morte haveriam de dar-lhe. E estando o conselho reunido, ordenaram que o fizessem comparecer com grande desonra. E abriram a porta mas não o encontraram. Então o povo ficou fora de si e todos encheram-se de admiração ao encontrar os selos intactos e a chave em poder de Caifás. Com isto, não se atreveram a pôr as mãos sobre aqueles que haviam falado diante de Pilatos em defesa de Jesus.
E enquanto estavam ainda sentados na sinagoga, cheios de admiração pelo caso de José, chegaram alguns dos guardas, aqueles a quem os judeus haviam encomendado a Pilatos a custódia do sepulcro de Jesus, e disseram que não foram seus discípulos que o haviam tirado de lá. E foram prestar contas aos arquissinagogos, aos sacerdotes e aos levitas dizendo-lhes o que aconteceu; isto é, como “sobreveio um terremoto e vimos um anjo que descia do céu, que retirou a pedra da boca da gruta, sentando-se depois sobre ela. E brilhou como neve e como relâmpago. Com o que nós, cheio de medo, ficamos como mortos. Então ouvimos a voz do anjo que falava às mulheres que se encontravam junto ao sepulcro: “Não temais, pois sei que buscais a Jesus, o que foi crucificado. Não está aqui; ressuscitou como havia dito; vinde, vede o lugar onde jazia o Senhor. E agora ide rapidamente e dizei aos seus discípulos que ressuscitou de entre os mortos e que está na Galiléia’.”
Os judeus então disseram: “A quais mulheres falava ele?” Os da guarda responderam:
“Não sabemos quem eram “. Os judeus disseram: “A que horas isto aconteceu?” Os da guarda responderam: “ã meia-noite”. Os judeus disseram: “E por que não as detivestes?” Os da guarda responderam: “Ficamos como mortos pelo medo, não acreditando que poderíamos ver de novo a luz do dia, como iríamos detê-las?” Os judeus disseram: “Deus vive e nós não acreditamos”. Os da guarda não responderam: “Vistes tantos sinais naquele homem e não acreditastes? Como ireis dar-nos crédito? E, com razão, haveis jurado pela vida do Senhor, pois Ele também vive”. E os da guarda acrescentaram: “Temos ouvido dizer que prendestes aquele que reclamou o corpo de Jesus, selando a porta, e que ao abri-la não o encontrastes. Entregai, pois, José e vos entregaremos Jesus”. Os judeus disseram: “José se foi para a sua cidade”. E os da guarda replicaram: “Também Jesus ressuscitou, como ouvimos o anjo, e está na Galiléia”.
Ao ouvir estas palavras os judeus sentiram medo e disseram: “Não deixeis que isto se espalhe porque senão todos inclinar-se-ão diante de Jesus”. E, convocado o conselho, fizeram um depósito de muito dinheiro e deram-no aos soldados, dizendo: “Dizei: “Enquanto dormíamos, seus discípulos vieram de noite e o levaram’. E se isto chegar aos ouvidos do governador, persuadi-lo-emos e livrá-los-emos de toda a responsabilidade”. Eles pegaram o dinheiro e falaram da maneira que lhes havia sido indicada.
Mas um sacerdote chamado Finees, Adas, o doutor, e Ageu, levita, desceram da Galiléia até Jerusalém e contaram aos arquissinagogos, aos sacerdotes e aos levitas: “Vimos Jesus em companhia de seus discípulos sentado no monte chamado Mamilch, e dizia-lhes: “Ide pelo mundo e pregai a todas as criaturas; aquele que crer e for batizado, salvar-se-á; mas aquele que não crer, está condenado. E aqueles que tiverem acreditado, estes sinais os acompanharão: arremessarão demônios em meu nome; falarão em novas línguas; colherão serpentes; e, mesmo que beberem alguma coisa capaz de produzir a morte, não lhes fará dano; imporão suas mãos sobre os enfermos e estes sentir-se-ão bem’. E, quando ainda lhes estava falando, vimos que ia subindo ao céu”.
Os anciãos, os sacerdotes e os levitas disseram: “Glorificai e confessai ao Deus de Israel se é que ouvistes e vistes o que acabais de dizer”. Os que haviam falado disseram: “O Senhor Deus de nossos pais Abraão, Isaac e Jacob vive, pois que ouvimos isto e o vimos ao ser elevado ao céu”. Os anciãos, os sacerdotes e os levitas disseram: “Viestes para prestar- nos conta de tudo isto ou para cumprir algum voto feito a Deus?” Então os anciãos, os pontífices e os levitas replicaram: “Se haveis vindo para cumprir um voto a Deus, qual a razão destas histórias mentirosas que haveis contado diante de todo o povo?” Finees o sacerdote, Adass, o doutor, e Ageu, o levita, disseram aos arquissinagogos e levitas: “Se
estes fatos que contamos, e dos quais fomos testemunhas oculares, constituem um pecado, aqui nos tendes em vossa presença; fazei conosco o que lhes pareça bom diante de vossos olhos”. Então eles pegaram o livro da lei e fizeram-nos jurar que não mencionariam a ninguém aquelas coisas. Depois deram-lhes de comer e de beber e tiraram-nos da cidade, não sem antes haver-lhes dado dinheiro e haver-lhes dado três homens para que os acompanhassem, e que deveriam levá-los até os confins da Galiléia. E foram-se em paz.
E depois que aqueles homens foram para a Galiléia, os pontífices, os arquissinagogos e os anciãos reuniram-se na sinagoga, fechando a porta atrás de si, e demonstrando grande dor, diziam: “Será possível que este portento aconteceu em Israel?” Então Anás e Caifás disseram: “Por que estais tão agitados? Por que chorais? Ou não sabeis que seus discípulos compararam-nos com uma boa quantidade de ouro e deram-lhes instruções para que digam que um anjo do Senhor desceu e removeu a pedra da entrada do sepulcro?” Mas os sacerdotes e anciãos disseram: “Pode ser que os discípulos tenham roubado seu corpo, mas, como sua alma entrou no corpo e está vivendo na Galiléia?” E eles, na impossibilidade de dar-lhes resposta para todas estas coisas, disseram enfim a duras penas: “A nós não nos é permitido acreditar em alguns não circuncidados”.
Mas Nicodemus levantou-se e pôs-se em pé diante do conselho, dizendo: “Falais perfeitamente. Não desconheceis, ó povo do Senhor, os varões que desceram da Galiléia, homens de recursos, tementes a Deus, inimigos da avareza, amigos da paz. Pois bem, eles disseram sob juramento que viram Jesus no monte Mamilch em companhia de seus discípulos, que estava ensinando todas as coisas que pudessem ouvir da sua boca e que o viram no momento de ser elevado ao céu. E ninguém perguntou-lhes de que maneira foi elevado. Então como ensinava-nos, estava contido no livro das Sagradas Escrituras que Elias foi elevado ao céu e que Eliseu gritou fortemente, fazendo com que Elias atirasse sua capa sobre o Jordão, e assim Eliseu pôde atravessar o rio e chegar até Jericó. Então os filhos dos profetas saíram ao seu encontro e disseram-lhe: “Eliseu, onde está Elias, teu senhor?’ Ele respondeu que havia sido elevado ao céu. E eles disseram a Eliseu: “Será que o espírito não o arrancou e o atirou sobre algum monte? Levamos nossos criados conosco e partamos em sua busca’. E convenceram Eliseu, que foi com eles. E andaram buscando-o durante três dias inteiros, sem encontrá-lo, pelo que tiveram conhecimento de que havia sido chamado. E agora dai-me atenção: enviemos uma expedição por todos os confins de Israel e vejamos se por ventura Cristo foi chamado por um espírito e foi depois atirado num desses montes”. Esta proposição agradou a todos e enviaram uma expedição por todos os confins de Israel em busca de Jesus e não o encontraram. Encontraram foi José de Arimatéia, mas ninguém atreveu-se a detê-lo.
E foram-se a prestar contas aos anciãos e aos sacerdotes e aos levitas, dizendo: “Demos a volta por todos os confins de Israel e não encontramos Jesus, mas encontramos sim José de Arimatéia”. Ao ouvir falar de José, os arquissinagogos, os sacerdotes e os levitas encheram-se de alegria, deram glória a Deus e puseram-se a deliberar de que maneira poderiam entrevistar-se com José. E pegaram um rolo de papel e escreveram o seguinte para José: “Que a paz esteja contigo; sabemos que pecamos contra Deus e contra ti. E temos rogado ao Deus de Israel que permita com que venhas ao encontro de teus pais e de teus filhos. Pois sabes que todos enchemo-nos de aflição quando, ao abrir a porta, não o encontramos. E agora nos apercebemos de que havíamos tomado uma determinação perversa contra ti; mas o Senhor veio em tua ajuda e Ele mesmo encarregou-se de dissipar nosso mau propósito, honorável pai José”.
E escolheram, entre todo Israel, sete varões amigos de José, os quais José conhecia, e os arquissinagogos, sacerdotes e levitas disseram-lhes: “Olhai, se ao receber nossa carta ele a ler, sabereis que virá até nós em vossa companhia: porém, se não a ler, entendi que está desgostoso conosco, e, depois de dar-lhe um beijo de paz, voltai aqui”. Em seguida, abençoaram os emissários e os despediram. Então estes chegaram ao lugar onde estava José, e fazendo-lhe uma reverência, disseram-lhe: “A paz esteja contido”. E ele por sua vez disse: “Que a paz esteja convosco e com todo o povo de Israel”. Então eles lhe entregaram a carta. José aceitou-a, leu-a, beijou-a e louvou a Deus, dizendo: “Bendito o Senhor Deus, que livrou Israel de derramar sangue inocente, e bendito o Senhor que enviou seu anjo e abrigou-me sob as suas asas”. Depois, preparou a mesa e ali comeram, beberam e dormiram.
No dia seguinte levantaram-se muito cedo e fizeram suas orações. Depois, José selou sua mula e pôs-se a caminho acompanhado daqueles homens e foram até a cidade santa de Jerusalém. E o povo em massa saiu ao encontro de José, gritando: “Entra em paz”. Ele disse dirigindo-se a todo o povo: “Que a paz esteja convosco”. E eles deram-lhe um beijo, prostrando-se em oração juntamente com José. E ficaram todos fora de si por poder contemplá-lo. Nicodemus hospedou-o em sua casa e em sua honra deu uma grande recepção, convidando Anás, Caifás, os anciãos, os sacerdotes e os levitas. E alegraram-se comendo e bebendo em companhia de José; e, depois de entoar hinos, cada qual foi para sua casa. José, porém, permaneceu com Nicodemus.
Mas no dia seguinte, que era sexta-feira, os arquissinagogos, sacerdotes e levitas madrugaram para ir à casa de Nicodemus. Este veio ao seu encontro e disse-lhes: “Que a paz esteja convosco”. E eles por sua vez disseram: “Que a paz esteja contigo e com José, com toda a tua casa e com toda a casa de José”. Então fê-los entrar em sua casa. O conselho estava todo reunido, e José veio sentar-se entre Anás e Caifás. E ninguém se atreveu a dizer-lhe uma palavra. Então José disse: “A quem obedece aquele que me convocou?” Eles fizeram sinais a Nicodemus para que falasse com José. Ele então abriu sua boca e falou-lhe assim: “Sabes que os veneráveis doutores, assim como os sacerdotes e levitas, desejam saber de ti uma coisa”. E José disse: “Perguntai”. Então Anás e Caifás pegaram o livro da lei e colocaram José sob juramento dizendo: “Glorifica e confessa a Deus de Israel. Sabei que Achar, ao ser conjurado pelo profeta Jesus, não cometeu perjúrio, mas sim anunciou tudo e não ocultou uma só palavra. Tu, pois, também não oculte de nós nenhuma palavra. E José disse: “Não ocultar-vos-ei uma só palavra”. Então eles lhe disseram: “Sentimos uma grande contrariedade quanto pediste o corpo de Jesus e envolveste-o em um lençol limpo e puseste-o no sepulcro. Por isso detivemos-te num recinto onde não havia nenhuma janela. Deixamos, além disso, as portas trancadas e fechadas a chave e dois guardas ficaram custodiando a prisão onde estavas fechado. Porém, quando fomos abrir, no primeiro dia da semana, não te encontramos e preocupamo-nos ao máximo e foi-se estabelecendo o espanto sobre todo o povo de Deus até ontem. Agora, então, conta-nos o que aconteceu contigo”.
E José disse: “Na sexta-feira, à décima hora, encarcerastes-me, e ali permaneci durante o Sabat todo. Mas à meia-noite, enquanto eu estava em pé orando, a casa onde me deixastes fechado ficou suspensa nos quatro ângulos e vi como que um relâmpago de luz diante dos meus olhos. Amedrontei-me, então caí ao chão. Porém, alguém pegou a minha mão e levantou-me do lugar onde estava caído. Senti depois que a água derramava-se sobre mim desde a cabeça até os pés e veio às minhas narinas uma fragrância de bálsamo. E aquela personagem desconhecida enxugou-me o rosto, deu-me um beijo e disse-me: “Não temas, José; abre teus olhos e olha para quem te fala’. Então levantando meus olhos, vi Jesus; mas
no meu estremecimento supus que era um fantasma e pus-me a recitar os mandamentos. E ele pôs-se a recitá-los junto comigo. Como sabeis muito bem, se um fantasma vem ao vosso encontro e ouve os mandamentos, foge rapidamente. Vendo, então, que recitava-os juntamente comigo, disse-lhe: “Mestre Elias’. Mas ele disse-me: “Não sou Elias’. Eu então disse: “Quem sois, Senhor?’ Ele disse-me: “Eu sou Jesus, aquele cujo o corpo tu pediste a Pilatos e envolveste com um lençol limpo, e puseste um sudário sobre a cabeça, e colocaste em tua gruta nova, e rolaste uma grande pedra à sua entrada’. E eu disse ao que me falava: “Mostrai-me o lugar onde te coloquei’. E ele levou-me e mostrou-me o lugar onde eu o colocara; nele estavam estendidos o lençol e o sudário que havia servido para seu rosto. Então reconheci que era Jesus. Depois ele pegou minha mão e deixou-me a portas fechadas dentro da minha casa; em seguida, acompanhou-me até minha cama e disse-me: “Que a paz esteja contigo’. A seguir deu-me um beijo, dizendo-me: “Até que se completem quarenta dias não saias de tua casa; pois eis que vou até a Galiléia ao encontro de meus irmãos’.”
Quando os arquissinagogos, sacerdotes e levitas ouviram estas palavras dos lábios de José, ficaram como mortos e caíram ao chão. E jejuaram até a nona hora. Então Nicodemus e José puseram-se a animar Anás e Caifás, os sacerdotes e os levitas, dizendo: “Levantai, ficai em pé e robustecei vossas almas, pois amanhã é o Sabat do Senhor”. E com isto levantaram-se, oraram a Deus, comeram, beberam e cada um voltou à sua casa.
No sábado seguinte, nossos doutores reuniram-se em conselho, bem como os sacerdotes e levitas, discutindo entre si e dizendo: “Que será esta cólera que se formou sobre nós? Porque, de nossa parte, conhecemos bem seu pai e sua mãe”. Então, Levi o doutor disse: “Conheço seus pais e sei que são tementes a Deus, que não descuidam de seus votos e que três vezes por ano dão seus dízimos. Quando Jesus nasceu, trouxeram-no a este lugar e ofereceram a Deus sacrifícios e holocaustos. E o grande doutor Simeão, ao tomá-lo em seus braços, disse: “Agora despeça o teu servo em paz, Senhor, segundo tua palavra; pois meus olhos viram tua salvação, que preparaste para a face de todos os povos; luz para a revelação dos gentios e glória do teu povo de Israel’. E Simeão abençoou-os e disse a Maria, sua mãe: “Dou-te boas novas com relação a este menino’. Maria disse: “Boas, senhor?’ E Simeão respondeu: “Boas; olha, este foi colocado para a queda e ressurreição de muitos em Israel e para seu um sinal de contradição. Tua própria alma será atravessada por uma espada de forma que os pensamentos de muitos fiquem a descoberto’.”
Então disseram a Levi o doutor: “Como sabes tu disto?” Ele respondeu: “Não sabeis que aprendi a lei dos seus lábios?” Os do conselho disseram: “Queremos ver teu pai”. E fizeram com que o pai de Levi fosse chamado. E, quando o interrogaram, ele respondeu: “Por que não acreditastes em meu filho? O bem-aventurado e justo Simeão em pessoa ensinou-lhe a lei”. E o conselho disse-lhe: “Mestre Levi, é verdade o que disseste?” Ele respondeu: “É verdade”. E os arquissinagogos, sacerdotes e levitas disseram entre si: “Eia! Enviemos à Galiléia os três homens que vieram trazer ao nosso conhecimento sua doutrina e sua ascensão, e que nos digam de que maneira viram-no elevar-se”. E esta proposição agradou a todos. Enviaram, pois, os três homens que os haviam acompanhado anteriormente até a Galiléia com essa incumbência: “Dizei ao mestre Adas, ao mestre Finees e ao mestre Ageu: “Que a paz esteja convosco e com os que estão em vossa companhia’. Tendo havido uma grande discussão neste conselho, viemos para levar-vos a este lugar santo de Jerusalém”.
Puseram-se, pois, os homens a caminho da Galiléia e os encontraram sentados e absortos com o estudo da lei. Deram-lhe um abraço de paz. Então disseram os varões galileus a quem havia ido buscar: “Que a paz esteja convosco”. E aqueles disseram de
novo: “A que viestes?” Os enviados responderam: “Chama-vos os conselho da santa cidade de Jerusalém”. Quando aqueles homens ouviram que eram procurados pelo conselho, fizeram orações a Deus, sentaram-se à mesa com os enviados, comeram, beberam, levantaram-se e puseram-se tranqüilamente a caminho de Jerusalém.
No dia seguinte, o conselho reuniu-se na sinagoga e os interrogaram dizendo: “É verdade que vistes Jesus sentado no monte Mamilch dando instruções aos seus onze discípulos e que presenciastes sua ascensão?” E os homens responderam desta maneira: “Da mesma maneira que o vimos ao ser elevado, assim vos contamos”.
Então Anás disse: “Separemo-los uns dos outros e vejamos se suas declarações coincidem”. E foram separados. Depois, em primeiro lugar, chamaram Adas e lhe disseram: “Mestre, como contemplaste a ascensão de Jesus?” Adas respondeu: “Enquanto ainda estava sentado no monte Mamilch e dava instruções aos seus discípulos, vimos uma nuvem que cobriu a todos com sua sombra; depois, a mesma nuvem elevou Jesus até o céu, enquanto que os discípulos jaziam com suas faces na terra”. Em seguida chamaram a Finees, sacerdote, e perguntaram-lhe também: “Como contemplaste a ascensão de Jesus?” E ele falou de maneira semelhante. Interrogaram também a Ageu, que respondeu de maneira semelhante. Então ele disse ao conselho: “Está contido na lei de Moisés: “Da boca de dois ou três toda a palavra será firme’.” E o mestre Buthem acrescentou: “Está escrito na lei: “E passeava Enoch com Deus, e já não existe, porque Deus levou-o consigo’.” Também o mestre Jairo disse: “Também ouvimos falar da morte de Moisés, mas não o vimos, pois está escrito na lei do Senhor: “E Moisés morreu pela palavra do Senhor e ninguém jamais conheceu, até o dia de hoje, seu sepulcro’.” E o mestre Levi disse: “E o que significa o testemunho que o mestre Simeão deu quando viu Jesus: “Eis aqui que este está colocado para a queda e ressurreição de muitos em Israel e como sinal de contradição’?” E o mestre Isaac disse: “Está escrito na lei: “Eis aqui que eu envio meu mensageiro diante de ti, o qual preceder-te-á para guardar-te em todo o bom caminho, pois meu nome é nele invocado’.”
Então Anás e Caifás disseram: “Haveis citado justamente o escrito na lei de Moisés, que ninguém viu a morte de Enoch e que ninguém mencionou a morte de Moisés. Mas Jesus falou a Pilatos, e nós sabemos que o vimos receber bofetadas e cusparadas no rosto; que os soldados cingiram-lhe uma coroa de espinhos; que foi flagelado; que recebeu sentença da parte de Pilatos; que foi crucificado no Calvário em companhia de dois ladrões; que se lhe deu de beber fel e vinagre; que o centurião Longinos abriu seu flanco com uma lança; que José, nosso honorável pai, pediu seu corpo e que, como disse, ressuscitou; que, como dizem os três mestres, viram-no elevar-se ao céu; e, finalmente, que o mestre Levi deu testemunho do que o mestre Simeão disse, e que disse: “Eis aqui este que está colocado para a queda e ressurreição de muitos em Israel e como sinal de contradição’.” E todos os doutores disseram em uníssono ao povo inteiro de Israel: “Se esta ira provém do Senhor e é admirável aos nossos olhos, conhecei sem dar margem a dúvidas, ó casa de Israel, que está escrito: “Maldito todo aquele que está preso a um pedaço de madeira’. E outro lugar da escritura menciona: “Deuses que não fizeram o céu e a terra perecerão’.” E os sacerdotes e levitas disseram entre si: “Se sua memória perdurar até Sommos (também conhecido pelo nome de Jobel), sabei que o seu domínio será eterno e que fará nascer para si um novo povo”. Então os arquissinagogos, sacerdotes e levitas exortaram todo o povo de Israel dizendo: “Maldito aquele que adorar qualquer obra saída de mãos humanas e maldito aquele que adorar as criaturas tendo ao lado o Criador”. E o povo em massa respondeu: “Amém, amém”.
Depois a multidão entoou um hino ao Senhor desta forma: “Bendito o Senhor, que proporcionou descanso ao povo de Israel de acordo com o que havia prometido; não caiu no vazio nem uma só de todas as boas coisas que disse ao seu servo Moisés. Que siga ao nosso lado o Senhor nosso Deus da mesma maneira que estava do lado dos nossos pais. Que não nos entregue à perdição para que possamos inclinar nosso coração até Ele, para que possamos seguir todos os seus caminhos e para que possamos praticar os preceitos e critérios que apregoou aos nossos pais. Naquele dia o Senhor será rei sobre toda a terra; não haverá outro ao seu lado; seu nome será unicamente Senhor, nosso rei. Ele nos salvará. Não há semelhante a ti, Senhor; sois grande, Senhor, e grande o teu nome. Cura-nos pela tua virtude e seremos curados; salva-nos, Senhor, e seremos salvos, pois somos tua pequena parte e tua herança. O Senhor não abandonará jamais o seu povo pela magnitude do seu nome, pois começou a fazer de nós o seu povo.
E todos depois, em coro, cantaram o hino e cada qual foi para casa dando graças a
Deus, porque aquele dia permanece por todos os séculos dos séculos. Amém.
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Eu li os evangelhos e ainda estou lendo o AT testamento, eu creio que vários profetas falaram do messias e da sua crucificação e seus sofrimentos que o noaao mestre tinha que passar.
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Para mim, que já li a Sagrada Escrituras, tanto o Primeiro Testamento, como o Novo Testamento várias vezes.
Bem sei, que tudo que tenho lido, no livros, apócrifos, de Nicodemos traz uma confirmação, de tudo que está escrito, em Mateus, Marcos, Lucas, e João e Creio que deveria estar, juntos dos livros da Sagrada Escritura.
Porque esse livro, apócrifos de Nicodemos traz, detalhes da morte de Cristo, e de sua ressurreição; muito mais sobre sua condenação.
E da negação dos líderes, judeus que não queria que foce proclamado, a ressurreição de Cristo.
Mais agora o que eu queria saber é porque não está?
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Glórias a Deus !